Por que letra de médico é ruim? A neurociência por trás da caligrafia

Prouni tem 85% de ociosidade em 2024 e acumula 2,5 milhões de bolsas não preenchidas em 12 anos
Ter uma letra bonita — ou ser o autor de terríveis garranchos — está relacionado a fatores como genética, aprendizado, educação e cultura. Conheça os detalhes de pesquisas que avaliaram a forma que usamos nossas mãos para escrever. Fatores como genética e cultura influenciam no formato de nossas letras
Getty Images/via BBC
As décadas de receitas escritas à mão no consultório criaram uma fama que virou até expressão popular: letra de médico.
Os garranchos de muitos profissionais de saúde são tão indecifráveis que até motivaram a criação de leis em diversos Estados do Brasil para exigir receitas digitadas no computador — ou, pelo menos, numa caligrafia legível e sem abreviações.
✏️Mas o que explica o formato de nossa letra? E por que algumas pessoas têm uma caligrafia tão perfeita, enquanto outras parecem ser incapazes de escrever de uma maneira minimamente legível para os outros?
A antropóloga Monika Saini, professora do Departamento de Ciências Sociais do Instituto Nacional de Saúde e Bem-Estar da Família da Índia, lembra que escrever à mão exige muita coordenação entre os olhos e nossas habilidades motoras.
"Eu diria que a escrita é uma das mais complicadas habilidades desenvolvidas pelo ser humano", diz a especialista ao programa de rádio CrowdScience, do Serviço Mundial da BBC.
O principal interesse acadêmico de Saini é entender os diferentes fatores que tornam a letra de cada um de nós única.
"A escrita depende de utensílios e de nossas mãos. E, quando pensamos nas mãos, falamos de algo muito delicado, composto de 27 ossos, que são controlados por mais de 40 músculos, a maioria deles localizados no braço e conectados com os dedos através de uma intrincada rede de tendões", detalha ela.
Isso significa que a nossa caligrafia é influenciada em parte pela anatomia e pelas características genéticas que herdamos de nossos progenitores.
Ou seja: a altura, a forma como você se senta, o ângulo do caderno ou do papel, a firmeza da sua mão, ser destro ou canhoto… Tudo isso influencia no formato das letras e das palavras que você produz.
Mas há também uma influência cultural que não pode ser ignorada aqui. Afinal, aprendemos a segurar lápis e canetas em casa, na primeira infância, com o auxílio dos mais velhos.
A forma que eles costumam usar esses utensílios é passada adiante, quando a criança faz os seus primeiros traços.
Logo depois vem a escola — e uma nova leva de influências dos professores e dos colegas de sala de aula.
Com o passar dos anos, a tendência é que nossa letra continue a mudar. Até porque, após os anos de formação e aprendizado, muitos de nós passamos a escrever menos no dia a dia.
E a falta de hábito, somada à pressa do cotidiano, pode nos deixar menos cuidadosos com a forma que traçamos letras, sílabas, palavras, frases, parágrafos…
Também não dá pra ignorar aqui o papel das novas tecnologias, que nos fazem digitar mais do que escrever à mão.
Em uma de suas pesquisas, Saini quis entender melhor quais eram os fatores mais importantes por trás da caligrafia de um indivíduo.
Para isso, ela elaborou um texto simples, sobre mudanças climáticas, e pediu que um grupo de voluntários copiasse as frases, usando o estilo de escrita manual ao qual estavam acostumados.
Ao receber os manuscritos, a antropóloga pode avaliar elementos como o tamanho da letra, o formato de cada símbolo, o espaço entre as palavras ou o quanto a pessoa conseguia seguir linhas retas nos parágrafos.
"Com auxílio de programas de reconhecimento de imagens, foi possível comparar as escritas com o padrão que eu havia compartilhado anteriormente", informa ela.
"Quando o pai ensina as habilidades de escrita para seu filho, existe uma alta probabilidade de encontrarmos alguma similaridade entre as duas caligrafias."
"Mas a letra de uma pessoa também é influenciada pelo tempo de escola ou pelo estilo de um professor em particular", pontua a pesquisadora.
📝O cérebro durante a escrita
A neurocientista Marieke Longcamp, da Universidade de Aix-Marselha, na França, estuda como somos capazes de escrever.
Para isso, ela usa aparelhos de ressonância magnética, que permitem visualizar em tempo real o cérebro de pessoas enquanto elas realizam certas atividades.
Numa dessas pesquisas, voluntários receberam um tablet capaz de gravar os movimentos da escrita à mão enquanto eram examinados.
Longcamp relata que foi possível observar a ativação de diversas partes do cérebro, que trabalham juntas para possibilitar o complexo ato de escrever.
"Regiões como o córtex pré-motor, o córtex motor primário e córtex parietal estão envolvidas no planejamento e no controle de gestos manuais", detalha ela, ao CrowdScience.
"Há também influências de estruturas da base do cérebro, como o giro frontal, que está envolvido em aspectos da linguagem, e o giro fusiforme, que processa a linguagem escrita."
"Uma outra estrutura fundamental aqui é o cerebelo, que coordena os movimentos e corrige nossos gestos", complementa ela.
A neurocientista lembra que a caligrafia depende basicamente de dois sentidos: a visão e a propriocepção.
"A propriocepção leva em conta as informações que vêm dos músculos, da pele e do corpo todo. Isso tudo é codificado enquanto nós escrevemos", explica ela.
📝Como a escrita influencia no aprendizado?
Nesse contexto, é curioso notar como a evolução da tecnologia pode influenciar a forma como compreendemos as informações.
Durante muitos séculos, a velha e boa escrita à mão era a única forma de tomar notas, estudar, memorizar e aprender diferentes coisas.
Mas essa realidade mudou radicalmente nos últimos anos, com a chegada de computadores, tablets e smartphones.
Hoje em dia, muitas pessoas mais novas aprendem a escrever com teclas e telas, e não mais com lápis, caneta e papel.
Será que essa transição tem algum impacto no aprendizado?
A professora de Psicologia e Neurociências Karin Harman James, da Universidade de Indiana, nos Estados Unidos, busca respostas para essa pergunta.
Ela estuda como as nossas mãos, e a forma como seguramos e manipulamos objetos, influenciam no desenvolvimento do cérebro e no jeito que aprendemos.
Segundo a especialista, há uma diferença em termos de funcionamento cerebral no ato de olhar uma letra, ou palavras, ou usar os sistemas motores do corpo para interagir com esses pedaços de informação escrita.
"Me interessei em entender como a interação de objetos com as nossas mãos permite ativar sistemas motores cerebrais", explica ela, ao CrowdScience.
Num experimento, James recrutou crianças com quatro anos, que ainda não sabiam escrever.
Em laboratório, esses voluntários mirins aprenderam uma entre três coisas: a completar traços para formar uma letra, a digitar uma letra e a escrever uma letra.
Quando todas haviam cumprido a primeira parte da atividade, elas foram submetidas a uma ressonância magnética.
"Nós mostramos às crianças diferentes letras, enquanto o cérebro delas era escaneado. Nesse momento, elas só precisavam olhar as letras que aprenderam a fazer no laboratório", descreve a neurocientista.
"Observamos que as crianças que aprenderam as letras por meio da escrita à mão tiveram uma ativação cerebral em áreas relacionadas a essas habilidades. Isso não aconteceu nos outros dois grupos, que completaram os traços ou digitaram", compara ela.
Mas a relação entre a caligrafia e o aprendizado não para por aí.
Numa outra pesquisa, James avaliou estudantes universitários.
A tarefa deles era participar de uma aula sobre um assunto do qual eles não sabiam nada. Na sequência, eles preencheram um questionário sobre como tomaram nota do que o professor ensinou.
No dia seguinte, todos os voluntários fizeram uma prova, baseada no conteúdo que foi passado anteriormente.
"Nós comparamos os resultados dos estudantes que tomaram nota à mão, no computador ou escreveram num tablet", diz a pesquisadora.
A neurocientista explica que, nas universidades americanas, é comum que professores compartilhem os slides com os alunos.
E uma parte dos estudantes adotou o hábito de abrir esse arquivo em tablets e fazer anotações à mão, com ajuda de canetas digitais, nos próprios slides.
"No nosso trabalho, estudantes que usaram o tablet e escreveram na tela se saíram melhor nos testes", diz ela.
"Isso aconteceu provavelmente porque os alunos tinham não apenas o material original, nos slides, como podiam colocar suas próprias anotações diretamente ali, à mão."
"Mas a escrita com caneta e papel também se mostrou benéfica. Os voluntários que usaram esse método se saíram melhor do que aqueles que digitaram as anotações no computador", acrescenta a especialista.
Em outras palavras, segundo as evidências mais recentes, se você quer realmente aprender algo, a melhor coisa a fazer é escrever à mão — seja no papel ou num tablet.
📝É possível melhorar sua letra?
Mas esse debate todo nos leva à discussão do início da reportagem: será que autores de garranchos podem ter uma letra melhor, para melhorar a legibilidade e aprender melhor?
No programa CrowdScience, a instrutora de caligrafia Cherrell Avery, de Londres, no Reino Unido, compartilhou algumas dicas que podem ajudar.
A primeira orientação dela é "ir devagar". Muitas vezes, escrevemos com muita pressa — e deixamos de prestar atenção no formato adequado das letras e das palavras.
Avery também pontua que é preciso entender o estilo de cada pessoa, até para saber qual o melhor utensílio de escrita, a forma de segurar a caneta/lápis, a postura adequada, o tipo de papel, entre outros fatores.
Segundo ela, é possível, sim, melhorar a caligrafia por meio de exercícios.
"É claro que uma única sessão de treinamento não é suficiente para obter mudanças significativas", pondera ela.
Mas com um pouco de insistência, é possível criar uma "memória muscular" que propicia um novo estilo de escrita.
"No início, isso é um esforço consciente. Mas, aos poucos, se torna um hábito e você nem pensa mais sobre essa nova forma de escrever", garante ela.
Por fim, Avery destaca que a escrita à mão ainda é importante para nós porque ela representa uma "extensão de nossa personalidade".
"É como se deixássemos um pouco de nós mesmos naquela página."
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Prouni tem 85% de ociosidade no 2º semestre 2024 e acumula 2,5 milhões de bolsas não preenchidas em 12 anos

Prouni tem 85% de ociosidade em 2024 e acumula 2,5 milhões de bolsas não preenchidas em 12 anos
Nos últimos 12 anos, o programa teve 24 edições e ofertou mais de 4,8 milhões de vagas. Dessas, apenas 48,9% foram efetivamente preenchidas, destinadas a estudantes que se enquadravam no perfil de beneficiários do programa. Aumenta ociosidade de bolsas do Prouni.
Luana Silva/g1
Menos da metade das bolsas ofertadas pelo Programa Universidade Para Todos (Prouni) entre 2013 e 2024 foram preenchidas. Isso representa quase 2,5 milhões de estudantes que perderam a chance de cursar o ensino superior por meio do programa do governo federal nestes 12 anos.
Criado em 2004, o programa oferece bolsas integrais (isenção de 100% no valor da mensalidade) e parciais (desconto de 50%) em instituições privadas de ensino superior de todo o país. O acordo é benéfico tanto para estudantes quanto para as instituições, que têm descontos em diversos impostos de acordo com o preenchimento das vagas do programa. (Entenda mais abaixo.)
Ao longo dos últimos 12 anos, o programa teve 24 edições (duas por ano) e ofertou mais de 4,8 milhões de vagas. Dessas, apenas 48,9% foram efetivamente preenchidas, destinadas a estudantes que se enquadravam no perfil de beneficiários do programa.
Ficaram ociosas quase 2,5 milhões.
Para Henrique Silveira, sócio de Educação do escritório de advocacia Mattos Filho, os números destacam problemas na cooptação de candidatos com perfil para a iniciativa.
"O Prouni é um programa muito importante e com resultados muito positivos. Mas a queda na taxa de ocupação das vagas mostra que, por algum motivo, o público-alvo tem perdido interesse na oportunidade. Sabemos que há milhares de pessoas com perfil para o programa, mas é preciso trazê-las para ele", avalia.
Aumento na ociosidade das bolsas
Historicamente, o primeiro semestre oferece mais vagas e tem maior diversidade de cursos. Por isso, a primeira edição do Prouni de cada ano tende a ser mais exitosa no preenchimento das vagas em comparação com o segundo semestre.
Ainda assim, entre 2013 e 2024, a única vez em que o preenchimento das bolsas ultrapassou o total de vagas ofertado inicialmente foi na edição do segundo semestre de 2016, resultando em ociosidade negativa das bolsas integrais.
Mesmo com esse feito, a média de ociosidade na edição, considerando as bolsas parciais, foi de 30%.
A partir de então, a média de ocupação das bolsas vem despencando nas duas edições do ano. Em 2024, 27% das vagas (parciais e integrais) foram preenchidas na edição do primeiro semestre, e somente 15% foram ocupadas no segundo semestre.
Percentual de ociosidade das vagas do Prouni (2013 a 2024)
Perfil do beneficiário do Prouni
Os critérios de participação no Prouni não costumam variar entre as edições. Uma das poucas exceções é o ajuste anual no critério de renda, que considera o salário mínimo do ano vigente.
Outra mudança estipulada recentemente foi a inclusão de estudantes oriundos de escolas particulares sem a condição de bolsistas no perfil de beneficiados do programa.
Antes de 2022, o programa não aceitava que um aluno que cursou o ensino médio em escola particular como estudante pagante concorresse a bolsas do Prouni. A mudança foi apresentada como uma medida para aumentar a inclusão social e diminuir a ociosidade das vagas, uma vez que os critérios de renda mínima per capita continuaram valendo para o novo público.
Para concorrer a uma bolsa em qualquer uma das edições do programa em 2024, o candidato devia:
ter realizado o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) em 2022 ou em 2023, e
ter obtido média mínima de 450 pontos nas áreas de conhecimento e nota superior a zero na redação.
Para calcular essa média, é preciso somar as notas individuais das quatro áreas do conhecimento das quais a prova é composta e dividir o total por quatro.
Além disso, era preciso atender a pelo menos um dos pontos abaixo:
Ter cursado o ensino médio completo em escola da rede pública;
Ter cursado o ensino médio completo em escola privada como bolsista integral;
Ter cursado o ensino médio parcialmente em escola da rede pública e parcialmente em instituição privada, na condição de bolsista integral;
Ter cursado o ensino médio parcialmente em escola da rede pública e parcialmente em instituição privada com bolsa parcial ou sem a condição de bolsista; ou
Ter cursado o ensino médio completo em escola privada com bolsa parcial da respectiva instituição ou sem a condição de bolsista;
Ser pessoa com deficiência, na forma prevista na legislação; ou
Ser professor da rede pública de ensino, exclusivamente para os cursos de licenciatura e pedagogia, destinados à formação do magistério da educação básica.
Sala de aula na Universidade Católica Dom Bosco (UCDB)
UCDB/Reprodução
Benefícios fiscais para as universidades
Os detalhes da isenção de impostos e de contribuições das instituições que aceitam o termo de adesão do Prouni são regidos por uma normativa de 2013 da Receita Federal.
O texto define que, durante o período de vigência do termo de adesão, as instituições ficam isentas dos seguintes tributos:
Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins);
Contribuição para o PIS/Pasep;
Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL); e
Imposto sobre a Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ).
Quando o programa foi criado, a isenção era calculada com base na oferta das bolsas. No entanto, desde 2014, o benefício fiscal está associado ao preenchimento das vagas.
“Se a instituição tem que ofertar, por obrigação legal, 10 bolsas, mas só preenche sete, ela vai ter 70% de isenção. Hoje, é assim que funciona”, explica Henrique Silveira.
Como as vagas criadas são calculadas
O cálculo exato para criação e preenchimento de bolsas é o seguinte:
A universidade que adere ao programa precisa criar uma vaga para cada 10,7 alunos pagantes matriculados no período letivo anterior. Ou seja, a cada 107 estudantes que pagam pelas mensalidades, a instituição criará 10 bolsas integrais de Prouni, no mínimo.
Mas, além de criar a vaga, a instituição precisa que essa quantidade mínima de bolsas seja preenchida para conseguir a totalidade da isenção de impostos. Então, não basta disponibilizar as vagas, é preciso que elas sejam ocupadas.
O que dizem representantes das instituições
Para as instituições privadas de ensino superior, o Prouni é um programa exitoso, mas possui problemas operacionais que dificultam justamente o preenchimento das vagas.
Lúcia Teixeira, presidente do Sindicato das Entidades Mantenedoras de Estabelecimentos de Ensino Superior (Semesp), avalia que a ociosidade das vagas é um problema que deveria ser combatido em parceria com o governo federal.
Para ela, a ocupação das vagas aumentaria com mais divulgação do programa por parte do governo, mas a flexibilização de aspectos do processo de seleção seria fundamental.
Atualmente, a nota de corte do Prouni é a média de 450 no Enem. Mas muitos alunos foram afetados pela pandemia e atingir essa média se tornou mais difícil. Talvez, em um primeiro momento, essa nota pudesse ser reduzida e o aspecto do prejuízo poderia ser considerado na seleção.
A presidente do Semesp sugere que o prejuízo de aprendizado trazido pelo estudante poderia ser combatido já durante o curso superior, em um projeto de recuperação de aprendizagem integrado à graduação.
"Quando falamos de Prouni, estamos falando de estudantes que já foram atravessados por diversos problemas sociais. Eles merecem o acesso garantido ao ensino superior e nós devemos, ao menos, avaliar essas nuances", defende.
Já Elizabeth Guedes, que preside o Conselho Deliberativo da Associação Nacional das Universidades Particulares (ANUP), concorda que os desafios são muitos, apesar de acreditar que os critérios de seleção do programa já são específicos para a população de interesse.
Para ela, os principais desafios atuais vão desde o calendário do programa até problemas recorrentes no sistema de seleção.
As aulas começam em fevereiro, mas a oferta das bolsas só acontece depois disso. Então, até terminar o processo de seleção das duas chamadas e da lista de espera, já é o meio do semestre letivo.
Elizabeth diz ainda que erros recorrentes no sistema de captação de alunos atrapalham o calendário já difícil do programa. “Às vezes, os alunos recebem a lista de aprovados, mas as instituições não recebem”, lembra.
Outro problema apontado pela especialista é prejuízo que faculdades menores e menos concorridas têm quando não preenchem o número mínimo de vagas.
"O benefício fiscal faz muita diferença para as faculdades menores. Quando uma delas não consegue a isenção total pela não ocupação das vagas, precisa retirar da pouca verba que recebe dos estudantes pagantes para cobrir o valor dos impostos. De outra maneira, esse dinheiro poderia ser investido em melhoria de infraestrutura, contratação de professores, ampliação de bibliotecas e afins”, analisa.
Apesar disso, ela avalia que o programa cumpre um papel fundamental ao viabilizar o ingresso de estudantes mais pobres em cursos de ensino superior, e permitindo às instituições privadas o cumprimento de uma função social importante na garantia da diversidade no corpo discente.
O que diz o MEC
O Ministério da Educação se pronunciou com a seguinte nota:
"Nos últimos 20 nos, o Prouni já beneficiou mais de 3,5 milhões de estudantes, sendo 2,5 milhões com bolsas integrais, que cobrem 100% do valor da mensalidade do curso superior. O restante obteve bolsa parcial, de 50% do valor do curso. Mulheres (57%) e negros (55%) foram maioria entre o público atendido pelo programa. Atualmente, o Prouni beneficia 651.390 bolsistas, matriculados em 1.856 instituições privadas de ensino superior no Brasil.
Para além dos dados, o impacto do programa pode ser verificado quando o seu potencial de transformação na vida dos beneficiados e suas famílias é o observado. No início, quando de sua criação, sofreu uma resistência, uma incompreensão quanto ao seu objetivo, mas hoje ele é uma unanimidade. Tanto que, recentemente, o MEC reuniu em um seminário gestores, representantes de instituições e ex-bolsistas do Prouni, que foram unânimes em avaliar que trata-se de uma política pública de grande sucesso.
O MEC realiza dois processos seletivos do Prouni a cada ano. As seleções dos estudantes são feitas com base no desempenho deles no Enem, portanto, a definição do calendário deve considerar a data de divulgação das notas do Enem, que nos últimos anos tem sido antecipada para a primeira quinzena do ano. Questões como operacionalidade sistêmica e demais ações administrativas estão sendo aprimoradas pelo MEC para que o Prouni continue sendo uma excelente oportunidade de ingresso no ensino superior. Por outro lado, é perceptível que a tentativa de desqualificar a formação superior, orquestrada como uma campanha contra a universidade brasileira, intensificada até 2022, teve seus efeitos também no Prouni, mas no processo seletivo mais recente já tivemos registro de recorde de inscritos por vaga de bolsa, o que espera-se, mantendo-se crescente a participação dos estudantes, venha a aumentar a taxa de ocupação das bolsas, num futuro próximo."
Ocupação e ociosidade de bolsas parciais do Prouni de 2013 a 2024.
Arte: Juan Silva/g1
Ocupação e ociosidade de bolsas integrais do Prouni de 2013 a 2024.
Arte: Juan Silva/g1
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Redação do Enem ou 'cover' de Machado de Assis?

Estudante do Sertão da Paraíba é aprovada em 7 universidades dos EUA: ‘dediquei todo o meu tempo a essa jornada’

Prouni tem 85% de ociosidade em 2024 e acumula 2,5 milhões de bolsas não preenchidas em 12 anos
Alice dos Santos aprendeu inglês sozinha e com o uso de materiais gratuitos. Ela se apaixonou por estudar tecnologia enquanto era aluna do IFPB. Alice durante viagem à Alemanha, após ganhar bolsa de 10 mil dólares
Alice dos Santos / Arquivo pessoal
Aos 20 anos, a paraibana Alice dos Santos Araújo Lourenço acumula diversas conquistas acadêmicas. Entre elas, o fato de ter sido aprovada em sete universidades dos Estados Unidos. No mês de agosto ela embarca rumo ao sonho de estudar em uma dessas instituições, com uma bolsa integral e o desejo de transformar a realidades de outras jovens, que assim como ela, apostam na educação para transformar vidas.
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As aprovações, mesmo que repetidas por um número expressivo de vezes, não são encaradas como parte da rotina.
“É aquele tipo de acontecimento que leva tempo para a ficha cair. Ainda não parece real. Fora os sentimentos de alegria e superação profundas, reconheço as barreiras quebradas que essa conquista representa para mim, minha família e meu estado”, refletiu.
A jovem nasceu e foi criada em Nova Olinda, cidade do Sertão da Paraíba, com pouco mais de 6 mil habitantes. Com a vida inteira no interior, ela conhece as dificuldades para ter acesso ao ensino tecnológico.
“Por isso, quero que essa oportunidade inédita que recebi não seja apenas minha, quero que os frutos dela sejam colhidos por outros jovens paraibanos. Quero que a gente mostre cada vez mais para o nosso Brasil que a Paraíba desenvolve sim jovens talentos em tecnologia”, destacou.
O interesse por estudar no exterior surgiu a partir de dois fatores: o primeiro era a curiosidade por conhecer outros países e culturas. Já o segundo, a descoberta das oportunidades profissionais e acadêmicas disponíveis fora do Brasil.
“Quando percebi que existia uma possibilidade real de estudar fora e viver esse conjunto de experiências, dediquei todo o meu tempo a essa jornada”, reforçou.
Alice durante viagem para a Índia
Alice dos Santos / Arquivo pessoal
Etapas das candidaturas às universidades norte-americanas
O processo de seleção para as faculdades dos Estados Unidos foi desafiador, mas também uma oportunidade transformadora para Alice. A jornada, para a jovem, começou no ano de 2023, com o auxílio da Academia Latino-Americana de Liderança (LALA), que é um programa de colocação universitária.
O processo envolve diversas etapas, como a proficiência no inglês por conta própria, demonstrar impacto por meio de atividades extracurriculares, enviar cartas de recomendação escritas por professores, notas do ensino médio, documentação financeira, uma redação pessoal e redações suplementares.
No primeiro ano de candidaturas, ela foi aceita em quatro instituições. Porém, não conseguiu bolsas que custeassem toda a viagem e estudos. Já em 2024, foram mais três aprovações. Confira na lista abaixo:
Aprovações em 2023:
University of British Columbia
University of Wisconsin – Madison
University of Colorado at Boulder
Stetson University
Aprovações em 2024:
University of North Carolina at Chapel Hill
University of Wisconsin – Madison
University of Connecticut
A escolhida foi a UNC-Chapel Hill, localizada na Carolina do Norte. Nela, a jovem ganhou uma bolsa integral que cobrirá, pelos próximos quatro anos, gastos com os cursos da faculdade, alimentação, computador, viagens de avião e tudo o que for necessário. As aulas começam em agosto deste ano.
“A UNC-Chapel Hill ganhou meu coração por vários motivos, como a comunidade vibrante de Tar Heels, sua localização no centro mais importante de pesquisa, inovação, tecnologia e educação dos Estados Unidos. E o fato da universidade oferecer a combinação curricular ideal para as áreas que desejo seguir profissionalmente”, confessou.
Alemanha, Índia, Itália e Noruega: 'sempre volto para casa com ideias novas e criativas'
Antes mesmo das aprovações nas universidades norte-americanas, Alice viveu outras experiência fora do país de origem.
2024 – Alice participou do Venetian ESummer, com bolsa de 100%, na Itália. O programa é focado em sustentabilidade e tecnologia. Essa foi a primeira experiência dela em outro país e durou uma semana.
2025 – A estudante ganhou uma bolsa de 10 mil dólares, com a ajuda da The Flight School (Escola do Voo), para viajar o mundo. Desde de janeiro, ela conseguiu viajar para Bangalore, na Índia; Trebur e Kraitchal, na Alemanha; e Eidsvoll, na e Noruega.
Em todos esses países, a paraibana se voluntariou para participar de projetos de tecnologia, educação e cultura.
“Hoje, após já ter vivido em alguns países como a Índia, onde passei dois meses, percebo que essa conexão com o desconhecido é essencial para a formação de jovens líderes visionários e inovadores. Sempre volto para casa com ideias novas e criativas para resolver, de forma incisiva, os desafios da minha comunidade”, destacou.
Alice durante viagem à Índia
Alice dos Santos / Arquivo pessoal
Alice aprendeu outros idiomas com material gratuito: 'vem abrindo muitas portas'
Atualmente, além do português nativo, Alice fala inglês em nível avançado e espanhol em nível básico.
Mas o caminho até atingir esse nível em línguas estrangeiras não foi fácil e despertou receio na jovem. “Medo de não desenvolver o idioma a tempo de aplicar para as faculdades naquele ano (2023) e a falta de recursos que poderiam potencializar o meu aprendizado, como um professor particular, por exemplo”, confessou.
Para conseguir o objetivo, ela estudou com materiais, dicionários, aplicativos e projetos gratuitos.
Dessa forma, ela se tornou a primeira da família a aprender inglês por conta própria. Essa conquista é motivo de orgulho para ela.
“Ter desenrolado o inglês vem abrindo muitas portas para a minha jornada acadêmica e profissional, para a minha família e com certeza para as gerações futuras de jovens que eu quero impactar através do ensino tecnológico”, declarou.
Pais apoiaram jovem a encarar desafios acadêmicos: 'minha família me inspira a seguir em frente'
Em toda a caminhada de desafios acadêmicos, Alice recebeu o apoio da família.
“Apesar das condições financeiras limitadas e falta de conhecimento em relação ao processo seletivo internacional, eles me apoiaram entendendo o meu momento de foco e dedicação, sempre acreditando no meu potencial de fazer acontecer”, recordou a jovem sobre a preparação para disputar uma vaga nos Estados Unidos.
Os pais de Alice trabalham de forma informal. A mãe dela atua como empregada doméstica. Já o avô, por quem também foi criada, é carpinteiro.
“Minha família me inspira a seguir em frente de forma humilde, sabendo que o meu valor está na minha educação e caráter”, destacou.
Estudar tecnologia é uma paixão: 'converter o meu conhecimento em soluções'
Estudar tecnologia é uma das paixões da vida de Alice, que começou quando ela era aluna do Instituto Federal da Paraíba (IFPB). Na instituição, a estudante participou de pesquisas científicas, projetos de extensão e aprendeu sobre programação.
“O que me fez realmente apaixonada por tecnologia foi a possibilidade palpável de converter o meu conhecimento em soluções para problemas reais da minha comunidade. Pra mim, não tem felicidade comparável aos momentos em que seus programas funcionam, você testa, faz os ajustes necessários e finalmente vê aquela aplicação melhorando algum aspecto da rotina da sua comunidade”.
Para o futuro, após se formar, Alice quer trabalhar com inovação em educação tecnológica e empreendedorismo social. E para isso, ela sonha grande, assim como as conquistas já alcançadas.
Alice quer se tornar a CEO da edtech – empresa que usa tecnologia para desenvolver e oferecer soluções no segmento da educação, buscando melhorar a experiência de ensino e aprendizagem – mais inovadora e acessível da América Latina. Além disso, ela também busca ser a líder do maior ecossistema de apoio a meninas de baixa renda em regiões interioranas e periféricas da América Latina.
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Prouni tem 85% de ociosidade em 2024 e acumula 2,5 milhões de bolsas não preenchidas em 12 anos

Prouni tem 85% de ociosidade em 2024 e acumula 2,5 milhões de bolsas não preenchidas em 12 anos
Nos últimos 12 anos, o programa teve 24 edições e ofertou mais de 4,8 milhões de vagas. Dessas, apenas 48,9% foram efetivamente preenchidas, destinadas a estudantes que se enquadravam no perfil de beneficiários do programa. Aumenta ociosidade de bolsas do Prouni.
Luana Silva/g1
Menos da metade das bolsas ofertadas pelo Programa Universidade Para Todos (Prouni) entre 2013 e 2024 foram preenchidas. Isso representa quase 2,5 milhões de estudantes que perderam a chance de cursar o ensino superior por meio do programa do governo federal nestes 12 anos.
Criado em 2004, o programa oferece bolsas integrais (isenção de 100% no valor da mensalidade) e parciais (desconto de 50%) em instituições privadas de ensino superior de todo o país. O acordo é benéfico tanto para estudantes quanto para as instituições, que têm descontos em diversos impostos de acordo com o preenchimento das vagas do programa. (Entenda mais abaixo.)
Ao longo dos últimos 12 anos, o programa teve 24 edições (duas por ano) e ofertou mais de 4,8 milhões de vagas. Dessas, apenas 48,9% foram efetivamente preenchidas, destinadas a estudantes que se enquadravam no perfil de beneficiários do programa.
Ficaram ociosas quase 2,5 milhões.
Ocupação e ociosidade de bolsas integrais do Prouni de 2013 a 2024.
Arte: Juan Silva/g1
Para Henrique Silveira, sócio de Educação do escritório de advocacia Mattos Filho, os números destacam problemas na cooptação de candidatos com perfil para a iniciativa.
"O Prouni é um programa muito importante e com resultados muito positivos. Mas a queda na taxa de ocupação das vagas mostra que, por algum motivo, o público-alvo tem perdido interesse na oportunidade. Sabemos que há milhares de pessoas com perfil para o programa, mas é preciso trazê-las para ele", avalia.
Aumento na ociosidade das bolsas
Historicamente, o primeiro semestre oferece mais vagas e tem maior diversidade de cursos. Por isso, a primeira edição do Prouni de cada ano tende a ser mais exitosa no preenchimento das vagas em comparação com o segundo semestre.
Ainda assim, entre 2013 e 2024, a única vez em que o preenchimento das bolsas ultrapassou o total de vagas ofertado inicialmente foi na edição do segundo semestre de 2016, resultando em ociosidade negativa das bolsas integrais.
Mesmo com esse feito, a média de ociosidade na edição, considerando as bolsas parciais, foi de 30%.
A partir de então, a média de ocupação das bolsas vem despencando nas duas edições do ano. Em 2024, 27% das vagas (parciais e integrais) foram preenchidas na edição do primeiro semestre, e somente 15% foram ocupadas no segundo semestre.
Perfil do beneficiário do Prouni
Os critérios de participação no Prouni não costumam variar entre as edições. Uma das poucas exceções é o ajuste anual no critério de renda, que considera o salário mínimo do ano vigente.
Outra mudança estipulada recentemente foi a inclusão de estudantes oriundos de escolas particulares sem a condição de bolsistas no perfil de beneficiados do programa.
Antes de 2022, o programa não aceitava que um aluno que cursou o ensino médio em escola particular como estudante pagante concorresse a bolsas do Prouni. A mudança foi apresentada como uma medida para aumentar a inclusão social e diminuir a ociosidade das vagas, uma vez que os critérios de renda mínima per capita continuaram valendo para o novo público.
Para concorrer a uma bolsa em qualquer uma das edições do programa em 2024, o candidato devia:
ter realizado o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) em 2022 ou em 2023, e
ter obtido média mínima de 450 pontos nas áreas de conhecimento e nota superior a zero na redação.
Para calcular essa média, é preciso somar as notas individuais das quatro áreas do conhecimento das quais a prova é composta e dividir o total por quatro.
Além disso, era preciso atender a pelo menos um dos pontos abaixo:
Ter cursado o ensino médio completo em escola da rede pública;
Ter cursado o ensino médio completo em escola privada como bolsista integral;
Ter cursado o ensino médio parcialmente em escola da rede pública e parcialmente em instituição privada, na condição de bolsista integral;
Ter cursado o ensino médio parcialmente em escola da rede pública e parcialmente em instituição privada com bolsa parcial ou sem a condição de bolsista; ou
Ter cursado o ensino médio completo em escola privada com bolsa parcial da respectiva instituição ou sem a condição de bolsista;
Ser pessoa com deficiência, na forma prevista na legislação; ou
Ser professor da rede pública de ensino, exclusivamente para os cursos de licenciatura e pedagogia, destinados à formação do magistério da educação básica.
Sala de aula na Universidade Católica Dom Bosco (UCDB)
UCDB/Reprodução
Benefícios fiscais para as universidades
Os detalhes da isenção de impostos e de contribuições das instituições que aceitam o termo de adesão do Prouni são regidos por uma normativa de 2013 da Receita Federal.
O texto define que, durante o período de vigência do termo de adesão, as instituições ficam isentas dos seguintes tributos:
Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins);
Contribuição para o PIS/Pasep;
Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL); e
Imposto sobre a Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ).
Quando o programa foi criado, a isenção era calculada com base na oferta das bolsas. No entanto, desde 2014, o benefício fiscal está associado ao preenchimento das vagas.
“Se a instituição tem que ofertar, por obrigação legal, 10 bolsas, mas só preenche sete, ela vai ter 70% de isenção. Hoje, é assim que funciona”, explica Henrique Silveira.
Como as vagas criadas são calculadas
O cálculo exato para criação e preenchimento de bolsas é o seguinte:
A universidade que adere ao programa precisa criar uma vaga para cada 10,7 alunos pagantes matriculados no período letivo anterior. Ou seja, a cada 107 estudantes que pagam pelas mensalidades, a instituição criará 10 bolsas integrais de Prouni, no mínimo.
Mas, além de criar a vaga, a instituição precisa que essa quantidade mínima de bolsas seja preenchida para conseguir a totalidade da isenção de impostos. Então, não basta disponibilizar as vagas, é preciso que elas sejam ocupadas.
O que dizem representantes das instituições
Para as instituições privadas de ensino superior, o Prouni é um programa exitoso, mas possui problemas operacionais que dificultam justamente o preenchimento das vagas.
Lúcia Teixeira, presidente do Sindicato das Entidades Mantenedoras de Estabelecimentos de Ensino Superior (Semesp), avalia que a ociosidade das vagas é um problema que deveria ser combatido em parceria com o governo federal.
Para ela, a ocupação das vagas aumentaria com mais divulgação do programa por parte do governo, mas a flexibilização de aspectos do processo de seleção seria fundamental.
Atualmente, a nota de corte do Prouni é a média de 450 no Enem. Mas muitos alunos foram afetados pela pandemia e atingir essa média se tornou mais difícil. Talvez, em um primeiro momento, essa nota pudesse ser reduzida e o aspecto do prejuízo poderia ser considerado na seleção.
A presidente do Semesp sugere que o prejuízo de aprendizado trazido pelo estudante poderia ser combatido já durante o curso superior, em um projeto de recuperação de aprendizagem integrado à graduação.
"Quando falamos de Prouni, estamos falando de estudantes que já foram atravessados por diversos problemas sociais. Eles merecem o acesso garantido ao ensino superior e nós devemos, ao menos, avaliar essas nuances", defende.
Já Elizabeth Guedes, que preside o Conselho Deliberativo da Associação Nacional das Universidades Particulares (ANUP), concorda que os desafios são muitos, apesar de acreditar que os critérios de seleção do programa já são específicos para a população de interesse.
Para ela, os principais desafios atuais vão desde o calendário do programa até problemas recorrentes no sistema de seleção.
As aulas começam em fevereiro, mas a oferta das bolsas só acontece depois disso. Então, até terminar o processo de seleção das duas chamadas e da lista de espera, já é o meio do semestre letivo.
Elizabeth diz ainda que erros recorrentes no sistema de captação de alunos atrapalham o calendário já difícil do programa. “Às vezes, os alunos recebem a lista de aprovados, mas as instituições não recebem”, lembra.
Outro problema apontado pela especialista é prejuízo que faculdades menores e menos concorridas têm quando não preenchem o número mínimo de vagas.
"O benefício fiscal faz muita diferença para as faculdades menores. Quando uma delas não consegue a isenção total pela não ocupação das vagas, precisa retirar da pouca verba que recebe dos estudantes pagantes para cobrir o valor dos impostos. De outra maneira, esse dinheiro poderia ser investido em melhoria de infraestrutura, contratação de professores, ampliação de bibliotecas e afins”, analisa.
Apesar disso, ela avalia que o programa cumpre um papel fundamental ao viabilizar o ingresso de estudantes mais pobres em cursos de ensino superior, e permitindo às instituições privadas o cumprimento de uma função social importante na garantia da diversidade no corpo discente.
O que diz o MEC
O Ministério da Educação se pronunciou com a seguinte nota:
"Nos últimos 20 nos, o Prouni já beneficiou mais de 3,5 milhões de estudantes, sendo 2,5 milhões com bolsas integrais, que cobrem 100% do valor da mensalidade do curso superior. O restante obteve bolsa parcial, de 50% do valor do curso. Mulheres (57%) e negros (55%) foram maioria entre o público atendido pelo programa. Atualmente, o Prouni beneficia 651.390 bolsistas, matriculados em 1.856 instituições privadas de ensino superior no Brasil.
Para além dos dados, o impacto do programa pode ser verificado quando o seu potencial de transformação na vida dos beneficiados e suas famílias é o observado. No início, quando de sua criação, sofreu uma resistência, uma incompreensão quanto ao seu objetivo, mas hoje ele é uma unanimidade. Tanto que, recentemente, o MEC reuniu em um seminário gestores, representantes de instituições e ex-bolsistas do Prouni, que foram unânimes em avaliar que trata-se de uma política pública de grande sucesso.
O MEC realiza dois processos seletivos do Prouni a cada ano. As seleções dos estudantes são feitas com base no desempenho deles no Enem, portanto, a definição do calendário deve considerar a data de divulgação das notas do Enem, que nos últimos anos tem sido antecipada para a primeira quinzena do ano. Questões como operacionalidade sistêmica e demais ações administrativas estão sendo aprimoradas pelo MEC para que o Prouni continue sendo uma excelente oportunidade de ingresso no ensino superior. Por outro lado, é perceptível que a tentativa de desqualificar a formação superior, orquestrada como uma campanha contra a universidade brasileira, intensificada até 2022, teve seus efeitos também no Prouni, mas no processo seletivo mais recente já tivemos registro de recorde de inscritos por vaga de bolsa, o que espera-se, mantendo-se crescente a participação dos estudantes, venha a aumentar a taxa de ocupação das bolsas, num futuro próximo."
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