Por que as pessoas mentem mais quando pensam em sexo?

Geração de jovens que quer beber menos impulsiona mercado de cervejas sem álcool
Segundo estudo, tendemos a 'distorcer' a verdade para que pessoas em que estamos interessados tenham opinião mais favorável sobre nós. Por que as pessoas mentem mais quando pensam em sexo?
BBC
Pensar em sexo nos torna mais propensos a mentir?
Uma pesquisa da Universidade de Rochester, nos Estados Unidos, e do Centro Interdisciplinar Herzliya, em Israel, fez uma descoberta reveladora: quando pensamos em sexo, nosso barômetro de honestidade fica distorcido, e tendemos a "ajustar" a verdade para que as pessoas em que estamos interessados tenham uma opinião mais favorável sobre nós. Veja aqui o vídeo
Para chegar a essa conclusão, os pesquisadores conduziram experimentos com pessoas heterossexuais de 21 a 32 anos.
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Eles dividiram os participantes em dois grupos. Um deles foi submetido a um processo que os pesquisadores descreveram como 'condicionamento sexual' e outro que não.
O estudo constatou que as pessoas do primeiro grupo, quando falavam deles próprios a possíveis parceiros sexuais, tinham 30% mais chances de mentir para “ajustar” seus interesses aos do possível parceiro.
Elas também diziam que o número de pessoas com as quais fizeram sexo era menor do que o real.
Os pesquisadores concluíram que "as pessoas vão fazer e dizer praticamente qualquer coisa para criar um vínculo com alguém em que estejam interessadas".

É verdade que as mulheres têm mais dificuldade de perder peso do que os homens?

Geração de jovens que quer beber menos impulsiona mercado de cervejas sem álcool
Suspeita é antiga, mas é realidade ou mito? E, se for verdade, os planos de perda de peso não deveriam ser adaptados de acordo com o gênero? 'Na medicina, em geral, muito do que fazemos na prática é baseado em estudos realizados em homens', diz o pesquisador E. Dale Abel.
Getty Images via BBC
Já aconteceu com você de seguir à risca uma dieta durante toda a semana e, ao subir na balança, ter uma decepção?
Se o efeito não foi o esperado, você sente frustação. Mas mais frustrante ainda é se você está seguindo uma dieta junto com um homem que perdeu mais peso do que você.
A reclamação é conhecida: "Ele só precisa parar de comer pão e já emagrece, mas eu…".
É verdade que é mais fácil para os homens perder peso do que para as mulheres? E que, portanto, os planos de perda de peso devem ser adaptados dependendo do gênero?
As respostas podem ser mais complicadas do que parece.
História completa
No ano passado, a Universidade de Copenhague, junto com outras 8 instituições de pesquisa, iniciou um estudo que colocou 2,5 mil pessoas pré-diabéticas e com sobrepeso em uma rigorosa dieta de controle de calorias por 8 semanas.
O resultado? Em média, os homens perderam 11,8 kg, e as mulheres perderam 10,2 kg.
Finalmente, havia evidências de que os homens teriam mais facilidade de perder peso do que as mulheres.
No entanto, as estatísticas não contam a história completa.
Homens têm um déficit energético maior
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"Foi decepcionante que a imprensa tenha focado nessa diferença sem entender bem a matemática", disse à BBC o professor Ian Macdonald, da Universidade de Nottingham, que participou do estudo.
Simplesmente focar nas diferenças no peso final foi, segundo ele, "infeliz".
A razão é que todos os participantes do estudo receberam a mesma quantidade de alimentos (810 calorias), sem considerar que os homens tinham um déficit energético maior.
Em primeiro lugar, os homens eram maiores (pesavam 109 kg em média, em comparação aos 96 kg das mulheres) e, portanto, tinham mais peso a perder.
Portanto, a diferença no resultado "foi apenas uma consequência da diferença no tamanho do corpo. Se tivéssemos homens menores e mulheres maiores, seria o contrário", explica o professor.
Isso não foi um descuido por parte dos cientistas.
Na pesquisa, se as mulheres estivessem mais pesadas que os homens no início da dieta, o resultado teria sido o contrário.
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O plano de oito semanas não foi o foco principal da pesquisa, mas o começo de outro estudo de três anos.
"Os participantes tiveram que perder 8% do peso corporal nesse período de 8 semanas para serem recrutados na dieta aleatória e no período de manutenção do exercício nos próximos 3 anos, como parte de um estudo de prevenção de diabetes", diz Macdonald.
Também houve relatos de que os homens perderam peso "melhor" que as mulheres: a pressão sanguínea e a frequência cardíaca diminuíram mais e houve diferenças no nível de queda de colesterol.
Mas Macdonald esclarece: "Embora houvesse algumas diferenças estatísticas, em termos de relevância clínica, elas não eram significativas. Homens e mulheres experimentaram benefícios com a perda de peso".
Então não há diferença?
O professor admite, no entanto, que existem diferenças na perda de peso entre homens e mulheres.
"Para o mesmo índice de massa corporal, os homens tendem a ter mais massa livre de gordura (músculo) e menor massa gorda. Isso se deve ao efeito dos hormônios sexuais na massa de gordura corporal, bem como na distribuição de gordura."
Por isso, "as mulheres geralmente acham um pouco mais difícil perder peso", segundo Tom Little, nutricionista e fundador da Color-Fit, empresa especializada em dietas para atletas profissionais.
"Os homens têm mais testosterona e são geneticamente projetados para ter uma porcentagem maior de músculo e menos gordura. A massa muscular tem um metabolismo maior que a gordura e, portanto, quanto mais músculo você tem, mais calorias você pode queimar, mesmo quando você não se exercita", diz ele.
"No entanto, a maioria dos estudos mostra que, embora os homens inicialmente percam peso mais rapidamente, as diferenças são compensadas ao longo do tempo."
Existem dietas mais adequadas para homens ou mulheres?
Neste ano, uma nova pesquisa da Universidade de Iowa examinou se os homens têm mais probabilidade que as mulheres de ter sucesso na dieta cetogênica — um plano alimentar com pouco carboidrato e alto teor de gordura. A pesquisa é tão nova que ainda não foi publicada oficialmente: "Até agora, a apresentamos apenas em reuniões científicas", explica o pesquisador principal E. Dale Abel.
O estudo foi realizado "por acaso". Os pesquisadores estavam investigando o impacto da dieta cetogênica como tratamento para insuficiência cardíaca. Eles notaram que os ratos machos da dieta perderam peso, mas as fêmeas ganharam.
"Percebemos que essa diferença era significativa entre machos e fêmeas na dieta cetogênica. Pensamos 'uau, que drástico!'. Portanto, a próxima pergunta era se isso era reproduzível", explica Jesse Cochran, coordenador da pesquisa.
"Toda vez, era a mesma coisa: ratos machos perdiam peso, fêmeas ganhavam."
Entre os ratos, as fêmeas engordaram e os machos perderam peso.
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Para descobrir se as diferenças se deviam aos hormônios sexuais, eles estudaram fêmeas que tiveram seus ovários removidos para simular um estado pós-menopáusico. Eles descobriram que, embora ganhassem peso (devido à deficiência de estrogênio, normalmente produzida pelos ovários), a dieta ceto não intensificava essa tendência.
Alerta!
Apesar de tudo, os cientistas universitários alertam que, em primeiro lugar, embora os ratos tenham perdido músculos e gorduras, isso pode ser porque a versão dessa dieta para ratos é restrita em proteínas (o que é necessário para que os ratos nesta dieta produzam as substâncias necessárias para transformar glicose em energia).
A dieta cetogênica para humanos contém proteínas, portanto, pode não haver perda muscular.
Abel e a equipe já receberam atenção da imprensa sobre o estudo, depois de apresentá-lo em reuniões científicas.
"Recebi muitos relatos de mulheres ou de seus profissionais de saúde que disseram: 'Faz sentido, eu sempre me perguntei por que (não funcionou para mim)'", diz ele.
"No entanto, quero advertir, em letras maiúsculas, que um rato não é uma pessoa. Eles podem nos dar uma ideia, e certamente estamos explorando questões moleculares e outros hormônios que podem nos ajudar a entender a diferença entre homens e mulheres", disse.
"O que é fundamental é que, se testes em humanos forem realizados, uma pesquisa cuidadosa deve ser feita para determinar se há diferenças no efeito dessas dietas devido ao gênero", acrescenta.
Uma razão pela qual ainda não temos uma resposta clara sobre se algumas dietas são mais adequadas para cada gênero é que a ciência em geral foi adaptada a apenas um deles.
"Na medicina, em geral, muito do que fazemos na prática é baseado em estudos realizados em homens. Há uma conscientização crescente de que é por isso que acho que uma observação como Jesse fez é crucial, pois destaca que existem diferenças fundamentais na biologia ", explica Abel.
Você deve escolher uma dieta baseada no gênero?
A resposta é: Não. Pelo menos até que haja mais pesquisas que esclareçam bem as coisas.
O especialista alerta: 'um rato não é uma pessoa'.
Getty Images via BBC
No entanto, Rick Miller, nutricionista do Hospital King Edward VII em Londres, explica que há algumas considerações que você pode ter em mente.
"Os planos baseados no gênero podem oferecer alguma personalização em relação às opções ou variações de exercícios que melhor se adequam a homens ou mulheres. Mas, em termos de nutrição, os requisitos gerais para proteínas, carboidratos e gorduras são baseados na composição corporal (proporções de massa gorda e massa magra). Portanto, um homem e uma mulher das mesmas proporções terão necessidades semelhantes de calorias e nutrientes por dia."
"Quando se trata de micronutrientes (vitaminas e minerais), existem algumas diferenças entre homens e mulheres. Por exemplo, a menstruação aumenta as necessidades de ferro da mulher devido à perda de sangue".
A chave para o sucesso de qualquer plano de nutrição, segundo ele, "é a personalização do estilo de vida, histórico médico e objetivos".
Recomendações
Embora (ainda) não tenhamos respostas definitivas para as perguntas, os especialistas com quem conversamos têm alguns conselhos para quem faz dieta, independentemente do gênero.
Todos concordam que, em vez de adotar uma dieta muito restritiva, é melhor optar pela abordagem "lenta e constante": fazer mudanças na alimentação saudável que sejam sustentáveis ​​a longo prazo.
"Pergunte a si mesmo: 'Posso manter essa mudança por toda a vida?'. Se a resposta for 'não', é possível que você pudesse ser um pouco mais flexível e ver o que mais poderia trocar. Isso impede você de tomar decisões drásticas que você não conseguiria manter."
A ideia, diz Millar, é que "não se sinta em uma 'dieta', mas sim que você está apenas fazendo pequenas alterações".

Estudo confirma existência de água em Europa, uma das luas de Júpiter

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Imagem composta mostrando pluma observada em Europa.
Ilustração/Nasa
No começo da semana saiu a notícia sobre o mapa geológico de Titã, a maior lua de Saturno e a segunda maior de todo o Sistema Solar. Na mesma edição da revista "Nature Astronomy" em que foi publicada essa pesquisa, um outro resultado tão importante quanto o mapa de Titã também foi publicado. Nesse caso, um resultado sobre uma das luas de Júpiter.
Há algumas décadas que se especula a existência de água em Europa, a menor das luas descobertas por Galileu Galilei em 1609. Em 1999, a sonda Galileo que orbitou o sistema Joviano determinou que havia uma substância fluida de condutividade elétrica muito alta. Levantamentos gravimétricos, pesquisa que mede a intensidade da gravidade, mostraram que Europa não deveria ter um núcleo rochoso simples. Ao invés disso, deveria ter um núcleo rochoso muito provavelmente recoberto por uma capa de uma substância líquida. Mais tarde, observações em Terra e no espaço feitas pelo Hubble mostraram plumas enormes sendo expelidas em Europa.
Europa vista pela sonda Galileo
Nasa
O cenário apontava mesmo para um oceano subterrâneo e sobre ele, uma crosta de gelo com espessura de 10-15 km que protegeria o oceano de evaporar para o espaço. De tempos em tempos uma fratura, ou rachadura, nesta crosta faria a água jorrar violentamente para o espaço, formando gêiseres. Assim que escapasse da proteção da crosta a água evaporaria formando uma pluma de neve e vapor.
Bom, você sabe que um cenário montado com hipóteses razoáveis e que se encaixam é muito bom para se explicar um fenômeno, mas nada se compara a uma comprovação direta. E era isso que faltava para o cenário de Europa.
Nessa segunda feira, Lucas Paganini e um time de mais 6 pesquisadores publicaram os resultados de uma campanha de 17 observações de Europa feitas no Havaí. Usando um espectrômetro, um instrumento que separa as componentes da luz, Paganini e seus colaboradores conseguiram identificar a presença de vapor d’água em uma das plumas de Europa.
A identificação foi bem sutil, das 17 observações feitas isso só foi possível em uma delas. Ainda assim, o volume calculado de água expelida na forma de vapor seria suficiente para encher uma piscina olímpica em poucos minutos!
E se você nos acompanha aqui no blog já sabe o porquê de tanto alvoroço com esse resultado. Se alguém quiser detectar vida fora da Terra deve começar sua procura por locais que tenham água. Não gelo e nem vapor, água líquida mesmo. O motivo é muito simples, a vida como conhecemos se desenvolveu com a água como o meio líquido que, entre outras coisas, intermedeia as trocas de substâncias ao nível celular. Então um bom começo para a procura é justamente “ir atrás da água”, ou “follow the water” como aparece nas páginas de astrobiologia da NASA.
Representação artística da sonda Europa Clipper sobrevoando a capa de gelo de Europa.
Nasa
Não é por coincidência que a vida na Terra tenha se baseado em água, ela deve ser a substância mais abundante do universo. Hidrogênio e oxigênio são os elementos mais abundantes no universo. Na verdade, o hélio é o segundo mais abundante, depois do hidrogênio, mas ele não se combina com nenhum outro elemento para formar uma molécula estável. Uma outra possibilidade é ter metano ou etano líquido para fazer o mesmo papel, como eu mencionei no post abaixo.
Como Europa tem um oceano abaixo da crosta de gelo, a sonda Galileo foi jogada contra Júpiter ao fim de sua missão, justamente para evitar qualquer tipo de contaminação. Estratégia igual foi usada com a sonda Cassini, para evitar que Titã fosse contaminado.
Esse resultado é fantástico, principalmente considerando que em 2023 a sonda Europa Clipper deve partir para estudar essa lua intrigante. A sonda vai carregar um conjunto de câmeras, espectrômetros e radares para investigar a camada de gelo de Europa em 45 voos rasantes. Essa estratégia deve dar a oportunidade de a sonda presenciar um evento de gêiser levantando uma pluma de vapor para ser estudada. Quando isso acontecer, seus espectrógrafos poderão identificar uma miríade de substâncias, inclusive alguma que identifique atividade de seres vivos abaixo do gelo.

A mãe que virou artista para se comunicar melhor com o filho portador de síndrome rara

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Luca é portador da Síndrome de Jacobsen, doença de pouquíssimos casos conhecidos no mundo; desenhos feitos pela mãe autodidata ajudam-na a explicar sentimentos e fatos cotidianos para ele. Manuela faz desenhos e gravuras para melhorar sua própria comunicação com o filho Luca: explicar-lhe sentimentos e conceitos do dia a dia, ampliar seu vocabulário e simplesmente entretê-lo
Arquivo pessoal/BBC
Entre outubro e novembro, a médica carioca Manuela Tasca lançou um desafio a si mesma. Em meio aos preparativos para uma cirurgia auditiva do filho Luca, 5, ela resolveu fazer um desenho por dia, entre corujas, ursos e luas coloridas.
"Lulu está perdendo a audição gradativamente pelo acúmulo de muco nos ouvidos", contou Manuela para seus seguidores no Instagram. "Para tornar a espera (pela cirurgia) mais leve, ocupar a minha mente e fazer algo produtivo, resolvi embarcar em um desafio criativo. (…) Os desenhos serão um presente para Lulu se divertir quando chegar ao hospital."
Luca é portador da raríssima Síndrome de Jacobsen, identificada apenas em 1973 e que afeta uma criança a cada estimados 100 mil nascimentos — há registros de apenas cerca de 300 pessoas diagnosticadas no mundo inteiro.
A cirurgia auditiva (que correu bem) visava implantar tubos de ventilação nos ouvidos de Luca, para impedir o acúmulo de muco, que é comum entre portadores da síndrome.
Há outras questões relacionadas à condição, em diferentes graus: atrasos no desenvolvimento motor e cognitivo, dificuldades de fala e aprendizado, baixa imunidade, problemas cardíacos em cerca de metade dos casos e, em mais de 90% dos casos, uma disfunção de plaquetas no sangue que pode causar sangramentos excessivos no caso de ferimentos simples.
Parte dos portadores de Jacobsen (não é o caso de Luca) são, também, do espectro autista.
"Mas a história de Lulu não é triste. Ao contrário, a história de Lulu é cheia de amor e arte", escreveu Manuela em 15 de dezembro de 2018, ao lançar sua conta de Instagram @artepralulu, no qual começou a postar os desenhos e gravuras que usa para melhorar sua própria comunicação com o filho: explicar-lhe sentimentos e conceitos do dia a dia, ampliar seu vocabulário e simplesmente entretê-lo.
Obras de arte produzidas pela artista para seu filho portador de síndrome rara
@arteparalulu/BBC
O barulho causado por um carro de bombeiros passando na rua, por exemplo, pode deixar Luca nervoso. Mas quando a mãe mostra a ele um desenho desse tipo de carro, Luca consegue associar os bombeiros ao motivo do seu incômodo. "O incômodo sensorial continua, mas ao saber de onde vem o barulho ele sabe melhor como lidar", explica Manuela.
Os desenhos ajudam também a orientar Luca no cumprimento de tarefas muitas vezes desafiadoras com qualquer criança pequena, como seguir o horário das refeições ou do banho. E, para Manuela, eles também ajudaram seu filho a dar um salto de desenvolvimento no último ano, quando Luca passou a falar.
"Quando entendemos que ele é muito visual (em seu aprendizado), vimos que esse (o desenho) é um recurso que faz diferença", conta ela à BBC News Brasil.
"Primeiro, inventamos uma linguagem própria de sinais para conversar com ele, já que ele tinha dificuldades motoras em fazer os sinais da linguagem de Libras. Mas queria que isso fosse uma ponte para ele aprender a usar as palavras. E hoje ele comunica suas necessidades e fala palavras-chave, como obrigado e por favor. Mas é incrível: ele foi de (falar) nada para isso. Sua fala se desenvolveu muito."
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Autodidata
O curioso é que Manuela, que é cardiologista, nunca teve qualquer educação formal em arte — e foi desenvolvendo sua técnica intuitivamente, a partir dos desafios do dia a dia e dos pedidos feitos pelo próprio Luca.
"Comecei a desenhar primariamente, primeiro imitando desenhos que via (na rede social) Pinterest e depois desenvolvendo meus próprios desenhos. Estou me divertindo muito, e comecei a trazer outros materiais, como aquarela e canetinhas", conta.
A arte também a ajudou na própria transição entre ter a carreira médica em tempo integral e passar a dedicar mais tempo aos cuidados com o filho.
"No começo, foi difícil o processo de entender que a minha criança é atípica. Pensava que precisaria me anular (para cuidar dele). Depois comecei a usar a arte e a me divertir, então estaria mentindo se dissesse que foi doloroso (fazer essa transição)", conta.
Hoje, Manuela dedica dois dias por semana à Medicina e, nos restantes, faz trabalhos esporádicos como fotógrafa e ilustração — a venda de algumas das artes autorais feitas para Luca ajudou a família a financiar terapias do menino.
A síndrome rara
A Síndrome de Jacobsen é causada pela deleção (ou apagamento) de um pedaço de um dos cromossomos de seus portadores, o de número 11. Manuela aprendeu que "pode ser algo aleatório ou transmitido pelos pais, e a gravidade (da síndrome) depende do tamanho da deleção" desse cromossomo.
"É algo muito novo: temos poucos estudos a respeito, e todos são financiados por um médico e pelas próprias famílias, que arrecadam dinheiro", conta.
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No Brasil, o grupo de apoio à síndrome frequentado por Manuela tem conhecimento de apenas 20 casos.
Por isso, alguns pais afirmam que, assim como Manuela, acabam aprendendo na prática a desenvolver as habilidades das crianças e a lidar com os desafios rotineiros.
Ao mesmo tempo, existem estudos internacionais documentando o papel das artes visuais em ajudar crianças com dificuldades cognitivas a interagir, se desenvolver, se expressar e aprimorar seu entendimento de noções de espaço e de conceitos abstratos.
Nos Estados Unidos, um guia para professores da Universidade Estadual de Ohio aponta que, para crianças do espectro autista, por exemplo, as artes oferecem possibilidades para fomentar "independência e colaboração, autoexpressão, imaginação e criatividade, além de criar um modo de se entender abstrações difíceis". Também melhoram as habilidades de comunicação e interação social dessas crianças.
Há estudos que apontam benefícios das artes para o desenvolvimento cognitivo, social e de linguagem para crianças em geral — a ideia é que, ao fortalecer o sistema de atenção do cérebro, as artes ajudariam a melhorar a cognição.
"Crianças em todas as culturas rapidamente se engajam em atividades artísticas e, no entanto, as artes (dança, teatro, desenho e música) tradicionalmente são tópicos marginais na disciplina da ciência do desenvolvimento", afirmam três cientistas de universidades americanas que revisaram a literatura sobre o tema em um estudo publicado em 2017 na Society for Research in Child Development.
"Argumentamos que psicólogos não podem ignorar essas atividades que envolvem tantos fenômenos básicos — atenção, engajamento, motivação, regulação emocional, entendimento dos demais etc. Apesar de questões históricas relacionadas a metodologias de pesquisa (…), uma onda recente de estudos rigorosos mostra a profundidade do aprendizado das artes e como o engajamento artístico pode ser usado na transferência para outras habilidades (nas crianças)."
Manuela não teve nenhum embasamento científico em seus desenhos, mas percebeu que a tática a ajudou a estreitar seu elo com o filho. "Fomos bem experimentais, indo de acordo com o que sentíamos (que funcionava) com o Luca", conta.
"Com certeza aumentou o nosso vínculo, e criamos uma dinâmica própria: ele faz encomendas dos desenhos que quer ou me pede versões diferentes."

Geração de jovens que quer beber menos impulsiona mercado de cervejas sem álcool

Geração de jovens que quer beber menos impulsiona mercado de cervejas sem álcool
No Reino Unido, multiplicam-se os estilos e cresce o número de cervejarias artesanais especializadas apenas nessa categoria. Becky Kean e o cunhado Andrew Keresey decidiram apostar nos rótulos sem álcool para que o pai dela, alcoólatra em recuperação, pudesse tomar uma boa cerveja
BBC
Se a britânica Becky Kean quiser algum dia organizar uma festa com álcool em sua cervejaria, ela vai ter que comprar bebidas em algum outro lugar.
Isso porque a empresa da jovem, a Nirvana Brewery, localizada em Londres, só produz cervejas sem álcool.
No cardápio há sete tipos deferentes da bebida, de pale ale a stout, até uma com chá verde. Nenhuma delas, entretanto, capaz de deixar os clientes bêbados.
Um década atrás, bares como o Nirvana talvez fossem incompreendidos ou ridicularizados. Sim, a cerveja sem álcool existe há bastante tempo – uma das pioneiras, a Kaliber, da cervejaria Guinness, foi lançada em 1986 -, mas costumavam vender pouco e, por isso, não chegavam a ganhar destaque no portfólio das marcas.
Em geral, elas eram do estilo pale lager, de um dourado pálido, e não muito agradáveis ao paladar dos bebedores – que quase sempre se restringiam ao motorista da rodada ou a grávidas.
Mas tudo isso mudou nos últimos anos, diante de um aumento expressivo no volume de cervejarias artesanais dos dois lados do Atlântico e do crescimento no número de pessoas que decidem beber menos ou eliminar completamente o álcool da vida.
Essa combinação permitiu que se multiplicassem nos últimos anos os rótulos de cervejas com baixo teor alcoólico ou sem álcool de diferentes estilos.
A tendência aparece nos indicadores de vendas. Segundo a consultoria britânica CGA, o comércio de cervejas com baixo teor alcoólico ou sem álcool no Reino Unido avançou 28% em volume nos 12 meses até fevereiro deste ano, na comparação com os 12 meses imediatamente anteriores.
A Alemanha também vive momento parecido, onde, de acordo com a Associação Alemã de Produtores de Cerveja (DBB), uma em cada 15 cervejas vendidas hoje no país não tem álcool.
Número cada vez maior de cervejarias no Reino Unido tem se especializado em cervejas de baixo teor alcoólico ou sem álcool
BBC
Não surpreende, portanto, que uma quantidade cada vez maior de cervejarias artesanais como a Nirvana venha optando por produzir apenas cervejas sem álcool ou com baixo teor alcoólico.
"Abrimos o negócio em 2017 e já estamos fabricando perto de meio milhão de garrafas por ano", diz Becky, de 29 anos.
"Há pouco tempo começamos a exportar para a Escandinávia e para a Suíça e estamos de olho nos mercados da Ásia e da América do Sul."
A jovem conta que o pai é alcoólatra em recuperação – e ela queria que ele também pudesse frequentar seu bar e beber uma boa cerveja. "Pra muitas cervejarias a bebida sem álcool é algo complementar, que vem depois, mas nós queríamos que este fosse nosso único foco."
Mas o que é exatamente uma cerveja sem álcool? A pergunta pode soar estúpida, mas no Reino Unido ela não tem uma resposta tão óbvia – é preciso olhar para dois percentuais que parecem semelhantes, mas são bem diferentes.
A cervejaria Big Drop Brewing hoje exporta cerca de 40% da produção
BBC
Em boa parte da União Europeia e nos Estados Unidos, uma cerveja é considerada sem álcool quando tem teor alcoólico igual ou menor que 0,5%.
Já no Reino Unido, esse percentual limite é menor, de 0,05%. Lá, uma cerveja com 0,5% de álcool só pode ser chamada de "desalcoolizada". Como a terminologia não é das mais simpáticas, a maior parte das cervejarias britânicas opta por classificar as bebidas como "de baixo teor alcoólico".
As cervejas estrangeiras com teor alcoólico entre 0,05% e 0,5%, entretanto, podem sem vendidas como "sem álcool" no Reino Unido – elas não precisam adaptar o rótulo às normas locais.
"Um sujeito não consegue ficar bêbado com uma cerveja com 0,5% de álcool não importa o quanto ele beba", diz Rob Fink, cofundador da Big Drop Brewing Company.
"Para você ter uma ideia, uma banana madura ou uma fatia de pão podem conter 0,5% de álcool."
"Isso é importante, porque é possível fazer cerveja de excelente qualidade com um teor alcoólico de 0,5%, mas é bem mais difícil fazer o mesmo com teor alcoólico de 0,05% – é preciso arrancar o álcool quase que completamente, o que acaba comprometendo muito do sabor", afirma o produtor.
Também baseada em Londres, a cervejaria de Fink só produz cervejas com baixo teor ou sem álcool – e exporta 40% da produção para Noruega, Dinamarca, Finlândia, Suécia e Canadá.
O cervejeiro Rob Fink (esq.) critica os critérios usados no Reino Unido para definir o que é cerveja sem álcool
BBC
Comparada à europeia, a indústria mundial de cerveja sem álcool ainda está engatinhando, diz Bill Shufelt, cofounder da cervejaria americana Athletic Brewing. Mas está expandindo rápido.
Quando montou sua empresa em Connecticut em 2017 com a proposta de produzir apenas bebida sem álcool, o cervejeiro ouviu de muita gente que estava louco.
"As pessoas faziam piada – mas isso sempre mudava quando elas experimentavam nossas cervejas."
Bill Shufelt, da Athletic Brewing, aposta no crescimento do mercado de cerveja sem álcool dos EUA
BBC
A Athletic vende hoje seus produtos em todo o país e recentemente começou a exportar também para o Reino Unido.
Lá, o aumento do consumo de cervejas com baixo teor ou sem álcool também vem sendo puxado pelas gerações mais jovens, diz o jornalista britânico Jeff Evans, especializado em cerveja.
"Bebedores mais jovens têm uma relação diferente com o álcool", afirma. "Eles bebem quando estão afim, mas muitas vezes não se importam de se divertir sem álcool"
"Eles também estão mais ligados à indústria de cervejas artesanais, marcada pela experimentação e pelo foco no sabor. Junte as duas coisas e a combinação é o que estamos vendo hoje: uma expansão do setor de bebidas de baixo teor alcoólico ou álcool zero."
A isso ele acrescenta ainda o fato de que as cervejarias têm cada vez mais conseguido desenvolver métodos de fabricação que preservam o sabor da bebida sem álcool e criar bebidas que são uma "excelente alternativa" às tradicionais.
A participação das cervejas sem álcool no Brasil ainda é pequena, mas o mercado também tem assistido à chegada de novos rótulos em paralelo ao crescimento das cervejarias artesanais – que saltaram de 70 para 700 no país nos últimos 10 anos, de acordo com a Associação Brasileira de Cerveja Artesanal (Abracerva).