Unicamp 2026: veja quando será o vestibular, data das inscrições e como pedir isenção de taxa

Se bebês formam memórias, por que não nos lembramos dos primeiros anos de vida?
Início das inscrições será em agosto e prova da primeira fase está marcada para ocorrer em outubro. Imagem de arquivo: estudantes realizam vestibular da Unicamp em 2025
Pedro Amatuzzi/g1
A Comissão Permanente para os Vestibulares da Unicamp (Comvest) divulgou nesta segunda-feira (24) o calendário para o Vestibular 2026. As inscrições poderão ser feitas a partir do dia 1º de agosto e a primeira fase está marcada para 26 de outubro.
📅 Confira abaixo o calendário completo:
Isenções da taxa de inscrição: 12 de maio a 6 de junho
Inscrições e pagamento da taxa de Inscrição: 1º de agosto a 1º de setembro
Prova de habilidades específicas – música: setembro
1ª fase do vestibular: 26 de outubro
2ª fase do vestibular: 30 de novembro a 1º de dezembro
Provas de habilidades específicas: 3 a 5 de dezembro
Divulgação dos aprovados em 1ª chamada: 23 de janeiro de 2026
De acordo com a Comvest, o calendário foi definido em reunião com os responsáveis pelos vestibulares de universidades públicas do estado de São Paulo que realizam processos seletivos próprios, com o objetivo de evitar que as datas coincidam e, assim, facilitar a participação dos candidatos interessados em mais de um processo seletivo.
Como pedir a isenção da taxa de inscrição?
Candidatos que atendam aos requisitos poderão solicitar a isenção da taxa de inscrição, que valerá tanto para o Vestibular Unicamp 2026, quanto para a modalidade Enem-Unicamp 2026, a partir do dia 12 de maio de 2025.
Os pedidos de isenção deverão ser realizados exclusivamente pela internet, na página da Comvest, até o dia 6 de junho. O envio da documentação (que constará do edital a ser publicado em breve) é feito também pela internet, no mesmo período. A lista de beneficiados será divulgada em julho.
Novidades
Haverá uma mudança na segunda fase, quando são aplicadas as provas específicas. Os candidatos deverão responder 18 questões e não mais 20. O objetivo, de acordo com o diretor da Comissão, José Alves de Freitas Neto, é deixar a prova menos exaustiva, considerando as exigências de leitura das questões.
“A redução considera as questões da parte específica do exame, de acordo com a área de conhecimento, nas quais os candidatos se empenham mais por conta dos respectivos pesos de cada matéria. Acreditamos que, com o ajuste, os candidatos terão mais tempo para ler bem os enunciados e articular as informações solicitadas”, explicou.
Com a mudança os candidatos terão, no segundo dia de provas da segunda fase, que responder à seguinte quantidade de questões:
Candidatos da área de ciências humanas/artes: 5 questões de história, 5 de geografia, 1 de filosofia e 1 de sociologia.
Candidatos da área de ciências da natureza: 7 questões de biologia, 5 de química.
Candidatos da área de ciências exatas/tecnológicas: 7 questões de física e 7 de química.
As demais provas da segunda fase do Vestibular Unicamp não serão alteradas e seguem sendo:
PRIMEIRO DIA (provas comuns a todos os candidatos):
Prova de redação (composta por duas propostas de textos para que o candidato eleja e execute apenas uma proposta);
Prova de língua portuguesa e literaturas de língua portuguesa, com seis questões;
Prova interdisciplinar com duas questões de língua inglesa e duas questões interdisciplinares de ciências da natureza.
SEGUNDO DIA (provas comuns a todos os candidatos):
Prova de matemática: com 6 questões para os cursos das áreas de ciências exatas/tecnológicas; 4 questões para os cursos das áreas de ciências biológicas/saúde e 4 questões para os cursos das áreas de ciências humanas/artes;
Prova Interdisciplinar: com 2 questões interdisciplinares de ciências humanas.
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UnB volta às aulas com greve de servidores técnico-administrativos

Se bebês formam memórias, por que não nos lembramos dos primeiros anos de vida?
Semestre letivo começa nesta segunda-feira (24); servidores pararam quinta (20). Reitora Rozana Naves diz que reuniões com categoria vão ajustar serviços essenciais, mas atividades administrativas ficam suspensas. Instituto Central de Ciências (ICC), localizado no Campus Darcy Ribeiro da Universidade de Brasília
TV Globo
A Universidade de Brasília volta às aulas, nesta segunda-feira (24), com greve dos servidores técnico-administrativos, que paralisaram as atividades na quinta-feira (20). A paralisação acontece por tempo indeterminado e afeta também a Biblioteca Central da UnB, que está fechada (veja mais abaixo).
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De acordo com o calendário acadêmico da UnB:
1° período de aulas de 2025: começa em 24 de março e termina em 26 de julho
2° período de aulas de 2025: vai de 18 de agosto até 15 de dezembro
Em entrevista à TV Globo, no sábado(22), a reitora da UnB disse que não é a primeira vez que um semestre da UnB começa com greve. Segundo Rozana Naves, haverá reuniões com a categoria para ajustar os serviços essenciais, mas as atividades administrativas vão ficar suspensas.
No entanto, Rozana Naves afirma que greve não vai interferir e o "semestre vai começar normalmente" (veja vídeo abaixo).
"O fluxo implica que o sindicato se faça representar pelo comando local da greve e defina, junto com a administração, aquelas atividades que vão ser consideradas essenciais para que as aulas possam fluir de forma tranquila", diz a reitora.
Reitora da UnB, Rozana Naves, fala sobre volta às aulas e greve de servidores.
Greve dos servidores técnico-administrativos
Os servidores técnico-administrativos da UnB reivindicam o pagamento da parcela de 26,05% da Unidade de Referência de Preços (URP), que compõe o salário.
🔎 URP: mecanismo para ajuste de preços, salários e contratos, visando combater a hiperinflação.
Segundo o Sindicato dos Servidores Técnico-administrativos da Fundação Universidade de Brasília (SINTFUB), o Supremo Tribunal Federal (STF) aprovou a continuidade da URP, em junho de 2024. Mas o sindicato diz que o Ministério da Gestão e Inovação (MGI) não liberou os recursos para o pagamento.
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Intervalo bíblico: prática de oração se dissemina pelas escolas e gera debate sobre liberdade de alunos e ação de pregadores

Se bebês formam memórias, por que não nos lembramos dos primeiros anos de vida?
Conforme advogados, os alunos são livres para exercer a liberdade de crença, mas a entrada de líderes religiosos nas escolas públicas pode ser inconstitucional em alguns casos. Nos últimos meses, vídeos de alunos evangélicos reunidos para ler a Bíblia e cantar louvores em escolas tem viralizado na internet. Chamado de intervalo bíblico ou devocional, o movimento tem se espalhado por colégios públicos e privados em diferentes estados, impulsionado por jovens que veem na prática uma forma de expressar sua fé durante a fase escolar.
Mas o que era uma iniciativa espontânea dos estudantes, passou a ganhar outra dimensão com a presença de pastores e influenciadores religiosos em escolas públicas.
Nas redes sociais, esses influenciadores compartilham vídeos de alunos chorando, cantando louvores e recebendo orações dentro dos colégios – o que especialistas avaliam que pode ser configurado como a prática de um culto. Na visão desses especialistas, o cenário levanta questionamentos sobre a laicidade do Estado e os limites da liberdade religiosa no ambiente escolar.
Advogados ouvidos pelo g1 explicam que, independentemente da religião, os alunos podem exercer a liberdade de crença, desde que isso não atrapalhe as atividades pedagógicas, que seja autorizado pela gestão e que respeite os limites da escola e de outros estudantes.
Já a entrada de líderes religiosos nas escolas públicas pode ser inconstitucional, se não estiver na grade curricular e inserido no contexto de ensino religioso previsto por lei. Neste caso, o artigo 19 da Constituição brasileira diz que órgãos públicos não podem promover ou favorecer cultos religiosos ou igrejas.
Você sabe o que é intervalo bíblico?
Abaixo, nesta reportagem você vai ver:
Intervalo bíblico: de alunos para alunos
Pastores e influenciadores nas escolas públicas
É proibido fazer intervalo bíblico?
Qual é o limite da atuação dos líderes religiosos?
Prós x contras: duas visões sobre o tema
Promotoria debate a prática em Pernambuco
Bruna Azevedo e Thalita Ferraz
Desde do ano passado, Felipe Arantes, de 15 anos, participa de um grupo de devocional na Escola Doutor Francisco Pessoa de Queiroz, localizada em Recife. O encontro, que é autorizado pelos gestores, acontece duas vezes por semana nos intervalos.
O jovem também conta que o devocional começou por livre vontade dos alunos – todos evangélicos – e não foi uma ordem de nenhuma igreja.
“Na minha visão como cristão, o intervalo bíblico é importante para alimentar e aumentar a nossa fé diante das dificuldades que enfrentamos na escola. Nos poucos minutos de encontro que a gente tem, nós cantamos louvores e lemos a bíblia”, disse Felipe.
Durante o segundo ano do ensino médio, em 2023, Nayane Ramos participou de um intervalo bíblico na Escola Estadual Anísio Teixeira, localizada em Natal. A jovem de 18 anos conta que o encontro foi autorizado pelos coordenadores “a partir do momento em que não houvesse conflitos na escola e não tirasse o foco dos estudos”.
“O devocional é importante para a conexão com Deus para quem é cristão. Como a escola pública é laica, os outros alunos de outras religiões também podiam se reunir se quisessem”, afirma.
Nayane conta à reportagem que teve um dia em que uma estudante da religião candomblé se sentiu desconfortável ao ver os alunos cristãos cantando louvores no intervalo. Mas, segundo a jovem, o caso não foi notificado para a direção da escola.
📍 ENTENDA: Conforme Brenda Riedel, presidente da Juventude Batista de Pernambuco (Jubape), os intervalos bíblicos, de forma geral, são encontros em que alunos cristãos de maioria evangélica se reúnem em um espaço da escola (como sala de aula, quadra ou pátio) para orar, ler a bíblia e cantar louvores.
A antropóloga Denise Pimenta, da Universidade de São Paulo, explica que esse movimento nas escolas existe há anos, mas por conta da internet e do crescimento no número de evangélicos no Brasil, os devocionais se popularizaram nas escolas.
O cristianismo tem como um de seus preceitos fundamentais a evangelização, que é sair do seu local de culto e ir para outros locais (shoppings, praças, baladas) para pregar e ‘converter’ outras pessoas. Esses jovens não surgem do nada; eles vêm de suas famílias, bairros e igrejas. Então eles já têm seus locais de culto e levam isso para a escola.
“No entanto, é importante analisar até que ponto isso ocorre de forma orgânica ou é orquestrado pelas próprias ordens religiosas. E até onde pode ser parte de um projeto político, possivelmente de extrema direita”, ressalta a especialista.
Pastores e influenciadores nas escolas públicas
Para além de uma manifestação espontânea dos alunos, há relatos de que pastores estão participando do intervalo bíblico com estudantes.
Erlany Vitória, de 18 anos, participou de um grupo de devocional durante o ensino médio na Escola Técnica Estadual Professor Agamemnon Magalhães, localizada no Recife. Ela conta que um pastor da Assembleia de Deus participou de um encontro com os alunos em 2024.
A participação do líder religioso foi a pedido da representante do intervalo bíblico e, segundo a jovem, teve autorização da coordenação.
“A gente só via alunos pregando a palavra, como eu já preguei. Foi muito bom ouvir um pastor para falar e aprofundar mais sobre os ensinamentos bíblicos”, declara Erlany.
Ainda em Pernambuco, Ivete Caetano, presidente do Sindicato dos Trabalhadores e das Trabalhadoras em Educação no estado (Sintepe), explica que recebeu denúncias de algumas situações relacionadas aos intervalos bíblicos, como:
Cultos e participação de líderes evangélicos nas escolas;
Alunos utilizando caixas de som e instrumentos musicais para cantar louvores – o que constrangeu estudantes de outras religiões.
Alunos utilizando, sem autorização, o material da escola para fazer os devocionais em grupo.
Atos de proselitismo – alunos buscando convencer os outros estudantes a adotarem a religião evangélica.
➡️ Essas denúncias chegaram ao Ministério Público de Pernambuco (MPPE), que realizou audiências para entender o cenário dos intervalos bíblicos no estado. (Para saber mais informações sobre o caso, veja o final da reportagem).
“Pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, nas escolas públicas não é permitido proselitismo [ato de tentar converter pessoas a uma religião, crença ou ideologia] e as igrejas não podem ter espaço de propagação de suas religiões, qualquer que sejam elas. As escolas são um espaço onde os alunos praticam a solidariedade, a tolerância e o respeito diante das diversidades”, ressalta Ivete Caetano, presidente do sindicato em Pernambuco.
Além de pastores de igrejas regionais, missionários famosos da internet são vistos fazendo “palestras” – o que especialistas avaliam que pode ser configurado como possíveis cultos – nas escolas públicas. Nas redes sociais, os influenciadores mostram alunos chorando, ajoelhados, cantando louvores e recebendo orações.
👉🏽 Um desses influenciadores se chama Guilherme Batista, de 34 anos, que possui quase um milhão de seguidores (955 mil) no Instagram. Ele contou ao g1 que, em nove anos, já realizou mais de 1 mil desses encontros em escolas públicas e privadas de Norte a Sul do país.
Os eventos têm duração de uma hora e meia e, segundo o evangelista, são tratados assuntos como suicídio, depressão, respeito aos professores e valorização dos pais. Ele afirma não receber nenhum dinheiro para realização dos encontros.
"É um trabalho de instrução na escola. Eu vou auxiliar o estudante que às vezes passa por uma depressão, que não encontra uma porta de saída. Como eu sou cristão, eu falo sobre a palavra de Deus, mas não é um trabalho de evangelização", conta o missionário.
"Entregando suas vidas a Jesus', disse influenciador em uma postagem após visitar um colégio militar em Goiás
Reprodução/Instagram
Guilherme também diz que os pais recebem informativos sobre o evento antes dele acontecer.
“Tem pais que são de outras religiões que nem mandam o filho naquele dia. Ou se o adolescente vai no dia, ao invés dele ver a palestra, ele fica fazendo outra atividade dentro da sala de aula. Teve poucas palestras em que eu fui criticado, mas nunca fui impedido. Normalmente quando a pessoa não gosta, ela se retira do momento. Ela não é obrigada a nada”, declara o influenciador.
Além disso, Guilherme Batista afirma não pedir nenhuma autorização aos responsáveis pela divulgação da imagem dos alunos na internet. Isso porque, segundo ele, são feitas publicações compartilhadas com as próprias escolas, que já possuem as autorizações.
👉🏽 Outro missionário famoso que realiza eventos religiosos em escolas públicas é o Lucas Teodoro. Ele é fundador do Aviva School, que segundo o site da organização, atua em escolas e universidades e tem como o objetivo a “evangelização global”.
O missionário também é responsável por treinar alunos para a realização de intervalos bíblicos e possui um curso que ensina pessoas a evangelizar nas escolas. Neste treinamento, que custa R$ 229,00, é apresentado como ter acesso às escolas, quais são as documentações necessárias e como criar conexão com os alunos, de acordo com o site oficial.
Influenciador Lucas Teodoro em escola
Reprodução/Instagram
Pamela Christiny, de 15 anos, participou do encontro Aviva no Colégio Estadual Professora Maria Luíza dos Santos Silva na cidade de Goianira, Goiás. Ela ressalta que foi uma “experiência cheia de aprendizado sobre a palavra de Jesus”, mas afirmou que os alunos não foram avisados sobre quem daria a palestra.
“No dia, a gente não sabia sobre o que seria o encontro. A nossa coordenação e os nossos professores avisaram que ia ter uma palestra e que era para a gente descer para o pátio, só que ninguém sabia do que ia ser a apresentação. Mas eu já estava desconfiando que seria o Lucas, porque ele já estava indo em escolas da minha cidade”, diz a estudante.
Lucas Teodoro e a coordenação do Colégio Estadual Professora Maria Luíza dos Santos Silva não responderam o contato do g1 até a mais recente atualização desta reportagem.
O advogado Álvaro Jorge, professor de direito da Fundação Getúlio Vargas (FGV), explica que o fato de os alunos não serem avisados e o conteúdo das supostas palestras podem ser problemáticos, diante da Constituição.
Palestras de várias religiões distintas que sejam convocadas em escolas públicas, desde que não sejam obrigatórias, não são problemáticas a princípio. Outras atividades que sejam de apoio aos estudantes também está tudo bem. O que não pode é dissimular uma atividade religiosa, dizendo que ela é uma atividade de empoderamento dos adolescentes ou palestra motivacional, e obrigar a participação quando, na verdade, o que está tendo ali é um ato religioso.
Já o professor Eulálio Figueira, doutor em ciência da religião e chefe do departamento de ciências Sociais da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), aponta que há a necessidade deixar claro os limites entre escola, religião e apoio aos alunos.
Ele cita, por exemplo, que as instituições precisam ter claro de quem é o papel de prestar apoio psicológico em casos de saúde mental (que deve ser prestado por profissionais especializados) e o que é a ação dos pregadores.
"Na escola e em lugares públicos, há a necessidade de separar a religião de problemas que não são religiosos. No caso da depressão e da ansiedade, não é papel de um religioso ir à escola; é preciso o acompanhamento de um psicólogo, de um profissional da saúde. É necessário um profissional, e não um pregador. A religião não resolve esses problemas por si só. Isso pode confundir os alunos, fazendo-os acreditar que estão em uma condição difícil porque não oram a Deus corretamente ou não seguem a religião", disse o professor.
O Brasil adota a separação entre Estado e Igreja (Estado laico), o que significa que o Estado não pode adotar ou privilegiar uma só religião e, sim, tolerar todas as religiões existentes. É isso que garante a liberdade de crença e de consciência religiosa, conforme o artigo 5° da Constituição.
Nas escolas públicas, esse preceito não seria diferente. Conforme o advogado Salomão Ismail Filho, promotor de Justiça do Ministério Público de Pernambuco (MPPE), os alunos podem “exercer a sua liberdade de crença desde que respeitem os limites da escola e dos outros estudantes, que também possuem o direito de ter ou não ter religião”.
“Se o jovem está no intervalo e ele quer se reunir com outros colegas para conversar ou fazer uma oração entre eles, desde que não esteja incomodando ninguém, eu não vejo problema algum, seguindo o princípio de liberdade de crença. Ao invés de chamar de ‘intervalo bíblico’, eu procuro chamar de ‘intervalo religioso’ para agregar outras religiões”, ressalta.
O advogado Álvaro Jorge, professor de direito da FGV, explica que a escola é capaz de proibir determinadas práticas religiosas caso isso atrapalhe a vida escolar, como um encontro no horário da aula ou desentendimento dos alunos por causa da religião, por exemplo.
O que não pode haver é a escolha de quais as religiões podem e quais não, porque isso fere a laicidade do Estado. Se a escola permite aos evangélicos cantarem no recreio, ela tem que permitir que todas as crianças das outras religiões possam fazer o mesmo. O ideal é que não deixem ninguém porque a escola não é um local de culto, é um local de estudo e isso pode trazer impactos negativos na educação.
Os advogados ouvidos pelo g1 alertam que é preciso tomar cuidado para que esses encontros entre os alunos não se transformem em verdadeiros cultos – com a presença de líderes religiosos, música alta e um grande grupo de pessoas, por exemplo. Conforme o artigo 19° da Constituição, as escolas administradas pelo Estado e outros órgãos públicos são proibidos de apoiar cultos ou igrejas, a não ser se for uma colaboração de interesse público, como um evento beneficente.
O advogado Salomão Ismail Filho analisa que, para não ferir a laicidade do Estado, figuras religiosas de diferentes religiões podem entrar nas escolas públicas a partir de um caráter ecumênico, visando o ensino religioso previsto por lei.
Ou seja, a pedido da gestão escolar, diferentes líderes religiosos podem ir nos colégios para mostrar as características de cada religião para os alunos, visando a educação e a diversidade.
📍ENTENDA: ecumênico é um termo usado para se referir ao esforço de promover a união e o diálogo entre diferentes religiões. O objetivo é superar divisões e enfatizar o que une os grupos religiosos. Em um evento ecumênico, podem se reunir padres, pastores, rabinos e outros líderes religiosos para dialogar ou trabalhar juntos em questões sociais, independentemente de suas crenças específicas.
Neste caso, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) assegura que o ensino religioso:
Precisa ter matrícula facultativa: os alunos não obrigados a participar;
Não pode ter proselitismo – tentativa de convencer ou converter pessoas a uma determinada religião ou crença.
“Qualquer entrada de uma pessoa estranha à comunidade escolar tem que passar pela gestão. Se as crianças são obrigadas a participar de uma atividade religiosa, aí sim tem alguma inconstitucionalidade e essa atividade deve ser suspensa. Já se a atividade for feita dentro de um contexto de ensino religioso previsto na grade curricular, ainda que seja sobre determinada religião, não haveria problema”, explica Álvaro Jorge, professor de direito da FGV.
Mas, é preciso tomar cuidado caso apenas um líder religioso compareça com frequência nas escolas públicas. Isso pode ser considerado que a gestão escolar esteja privilegiando uma religião, o que é inconstitucional conforme o artigo 19 da Constituição:
“É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvencioná-los, embaraçar-lhes o funcionamento ou manter com eles ou seus representantes relações de dependência ou aliança, ressalvada, na forma da lei, a colaboração de interesse público”.
Em relação aos missionários influenciadores nas escolas, os especialistas ouvidos pelo g1 ressaltam que é necessário ter mais dados para entender se é inconstitucional, como:
As atividades estão presentes na grade escolar?
Os alunos são obrigados a participar?
São realizados cultos nas escolas?
As imagens de alunos menores de idade são divulgadas na internet sem autorização dos pais ou responsáveis legais?
Além disso, cada caso precisa ser levado para as secretarias de educação e, se for necessário, passar para o Ministério Público de cada estado.
‘A escola não é um espaço religioso’
O professor Eulálio Figueira, chefe do departamento de ciências sociais da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), argumenta que não vê problema, a princípio, que um grupo de alunos converse sobre suas religiões na hora do intervalo escolar – caso isso seja espontâneo e conversado com a diretoria.
Mas afirma que é necessário que os gestores conversem com os alunos para saber a origem/motivo desses encontros, e investigar caso seja uma ordem de uma igreja ou grupo político, por exemplo.
Além disso, na visão dele, a gestão precisa estar atenta para que na escola não se crie um ambiente que obrigue, consciente ou inconscientemente, estudantes a aderirem determinada religião. Neste caso, é preciso tomar cuidado com excessos, como proselitismo e a formação de cultos nas escolas, o que é inconstitucional.
“Mesmo que sejam voluntários, há uma responsabilidade da direção pedagógica da escola de discutir essas práticas com os estudantes. Simplesmente abrir o espaço? Não sou favorável exatamente por conta do que pode estar associado. A escola não é um espaço religioso para a oração. A oração tem seus espaços particulares, a escola é um espaço público para a educação”, afirma.
Por outro lado, Eulálio se coloca contra a entrada de influenciadores famosos, que, segundo ele, expõem a vulnerabilidade de menores nas redes sociais e transformam supostas palestras em cultos evangélicos. Para ele, a entrada de figuras religiosas nas escolas só é válido no contexto da educação religiosa prevista por lei, a fim dos alunos conhecerem diferentes visões de mundo.
“Minha posição não é só referente a líderes evangélicos, mas a todos [representantes de outras religiões]. Vivemos em um país laico, que deve zelar pela liberdade de expressão e religião. O direito à não ter religião também faz parte da liberdade religiosa”, conclui.
‘Intervalo bíblico pode gerar pertencimento’
Já a antropóloga Denise Pimenta, da Universidade de São Paulo (USP), analisa que os intervalos bíblicos não devem ser proibidos, caso não atrapalhem a vida escolar. Para ela, assim como um futebol ou uma dança de K-pop com os amigos durante o intervalo, o devocional é uma forma de interação e pertencimento que não pode ser ignorada.
Proibir o intervalo bíblico poderia nos aproximar de políticas como a proibição do véu na França, que gera debates acalorados sobre liberdade religiosa. A escola é um espaço de diversidade e reflexão, e a presença evangélica deve ser analisada como parte da transformação social em curso. A questão central é pesquisar como a escola se torna um possível braço de movimentos religiosos e qual a relação disso com a política.
Além disso, a pesquisadora ressalta que movimentos evangélicos nas escolas acontecem há, pelo menos, duas décadas. E que o volume desses encontros pode ter aumentado nos últimos anos pelo aumento no número de evangélicos no Brasil.
“A atual geração Z e a geração Alfa são diferentes das anteriores. Elas se interessam menos por álcool e mais por jogos eletrônicos e religião. Essa mudança acompanha a crescente presença evangélica no Brasil, que caminha para superar o catolicismo em número de adeptos, segundo o IBGE. O Brasil é um país profundamente religioso e essa virada evangélica se manifesta na política, na cultura e nas instituições e, por isso, causa estranhamento”, diz.
No ano passado, o Ministério Público de Pernambuco (MPPE) realizou audiências para analisar a ocorrência dos intervalos bíblicos nas escolas públicas. Isso aconteceu após o órgão receber denúncias do Sindicato dos Trabalhadores e das Trabalhadoras em Educação no Pernambuco (Sintepe) sobre possíveis excessos relacionados aos encontros religiosos, que poderiam ferir a laicidade do Estado.
Conforme a presidente do Sintepe, Ivete Caetano, em algumas escolas de Pernambuco estavam acontecendo as seguintes situações:
Cultos e participação de líderes evangélicos nas escolas;
Alunos utilizando caixas de som e instrumentos musicais para cantar louvores – o que constrangeu estudantes de outras religiões.
Alunos utilizando, sem autorização, o material da escola para fazer os devocionais em grupo.
Atos de proselitismo – alunos buscando convencer os outros estudantes a adotarem a religião evangélica.
Assim que o assunto das audiências do MPPE foi para a mídia, diversos boatos começaram a ser divulgados nas redes sociais, como uma proibição definitiva dos intervalos bíblicos. Isso gerou uma revolta generalizada de pais, alunos e políticos evangélicos, que afirmavam estar havendo uma perseguição religiosa.
“O nosso intuito não foi acabar com os intervalos religiosos, mas sim discutir os possíveis excessos e propor soluções”, declarou o promotor do MPPE, Salomão Ismail Filho.
Segundo o promotor, as investigações ainda estão em andamento, mas ressalta que os intervalos religiosos, como ele prefere chamar, precisam ser regulamentados pela Secretaria de Educação de Pernambuco.
Festa junina, das tradições ou da colheita?

Técnica do ‘cérebro podre’: alunos usam app para transformar material de aulas em vídeos viciantes

Se bebês formam memórias, por que não nos lembramos dos primeiros anos de vida?
Programas convertem arquivos de PDF em vídeos com linguagem de TikTok e imagens genéricas e descontextualizadas, como as dos jogos ‘Subway Surfers’ e ‘Minecraft’ . Técnica do ‘cérebro podre’: alunos usam app que transforma textos longos em vídeos curtos
Imagine a seguinte situação: um aluno do ensino médio precisa estudar um capítulo de 11 páginas do livro de biologia. No material, há ilustrações, gráficos e textos detalhados sobre estruturas celulares e transporte de secreções.
🚨A prova é amanhã. O que fazer? Se você pensou no mais óbvio (ler as 11 páginas), está na contramão da nova tendência de crianças e jovens no exterior: eles usam vídeos de “brain rot” (“cérebro podre”, em inglês) para driblar a dificuldade de concentração e deixar o conteúdo mais apelativo e resumido.
Sites e aplicativos específicos transformam o arquivo PDF em uma sucessão de imagens genéricas, muito estimulantes visualmente e com baixa exigência cognitiva, apenas para reter a atenção dos estudantes. Enquanto isso, um robô "lê em voz alta" o que estava escrito no texto.
📱Exemplo: O g1 fez um teste e enviou o capítulo de biologia citado acima, retirado de um livro didático, para uma dessas plataformas de inteligência artificial. O material foi convertido em um vídeo de 59 segundos, narrado por uma daquelas vozes automáticas do TikTok:
“POV: você está na aula de biologia, vibe check. Vamos falar sobre a rota secretora. Primeira coisa: a estrela aqui é o retículo endoplasmático. O rolê todo é uma coreografia celular, bem fluido!”
As imagens que aparecem ao longo dessa narração simplificada não têm absolutamente nada a ver com células: são cenas de “Subway Surfers” (jogo de corrida interminável). Ou seja: para o jovem prestar atenção ao que está sendo dito (e que já é uma versão resumida do conteúdo), ele precisa de um estímulo visual de videogame para manter os olhos na tela.
➡️Segundo especialistas ouvidos pelo g1, substituir a leitura por esse tipo de conteúdo pode gerar uma falsa sensação de aprendizado, limitar o desenvolvimento do senso crítico, reduzir o vocabulário e piorar ainda mais os distúrbios de foco. (leia mais abaixo)
“Os estudantes estão com dificuldade de manter a concentração em textos longos, principalmente se forem mais densos. Eles se acostumaram a consumir muita informação em vídeos rápidos, como no TikTok ou nos reels”, afirma Danilo Torini, gerente de tecnologias do ensino com aprendizagem da ESPM.
“Acabam aplicando o mesmo princípio das mídias sociais na aprendizagem: buscam a gamificação para liberar a dopamina [hormônio da felicidade].”
Abaixo, nesta reportagem, entenda:
o funcionamento dessas plataformas de “brain rot”;
os riscos de usar a técnica do “cérebro podre” para estudar.
🤔Como as plataformas funcionam?
Vídeo gerado por IA mostra conteúdos aleatórios enquanto reproduz áudio sobre células
Reprodução
Aplicativos e programas (pagos ou gratuitos) como Coconote, Raena, PDF to Brain Rot e TurnoLearn AI têm um princípio de funcionamento parecido:
O aluno faz o “upload” de um arquivo em formato PDF.
Em seguida, o site sugere as opções de vídeos “brain rot”: é possível escolher entre cenas de videogame (como de Minecraft, de Subway Surfers ou de jogos de basquete, por exemplo), de ASMR (aquelas imagens criadas para gerar sensações relaxantes e agradáveis ou de memes genéricos) ou de memes aleatórios.
O sistema, então, gera um vídeo cujo áudio é exatamente a leitura em voz alta do que está escrito no PDF. Enquanto o estudante ouve a gravação e lê as legendas, o que passa na tela é o conteúdo “brain rot” escolhido.
Resultado: em vez de ler um artigo científico de 30 páginas, o aluno assiste a um vídeo superficial e estimulante, para conseguir manter o foco por mais tempo. Um texto sobre energia eólica, por exemplo, vira um jogo virtual com um bonequinho de LeBron James tentando fazer uma cesta de basquete, enquanto o áudio explica a força dos ventos.
➡️Observação: Em alguns aplicativos, existe a opção de pedir uma adaptação do conteúdo. No Raena, por exemplo, o tópico é resumido e recontado com gírias de redes sociais. No exemplo dos ventos, o resultado trouxe frases como:
“Essa vibe do vento já movimentou muita coisa, antes do rolê da eletricidade”.
🤔Os vídeos de ‘brain rot’ podem atrapalhar os estudos?
Um conteúdo sobre energia eólica pode virar uma corrida de caminhões entre montanhas
Reprodução
Andrea Jotta, do Laboratório de Estudos da Psicologia em Tecnologia, Informação e Comunicação da PUC-SP, afirma que, “depois da pandemia, os alunos voltaram para a escola ainda mais acostumados ao ensino virtual”.
“Eles passaram dois anos conciliando várias telas: uma com jogo, outra com aula. Podemos limitar o uso do celular, até por questões de saúde mental, mas eles vão continuar tentando achar saídas para tornar o estudo menos entediante. É uma tendência difícil de ser revertida”, diz.
🖥️Torini, da ESPM, explica que os vídeos em si não são um problema: tudo vai depender da frequência e do tipo de uso.
“Pode ser uma estratégia complementar ao estudo tradicional, para ajudar na memorização”, diz o professor. Seria o caso de quem primeiramente lê o capítulo do livro, relê as anotações feitas em aula, reflete sobre o conteúdo e, só depois, gera um vídeo de "brain rot" para fixar o aprendizado.
Mas, se ocorrer a substituição da leitura pelos vídeos — como os próprios estudantes relatam nas redes sociais —, haverá o risco de consequências como:
❌Falsa sensação de aprendizagem: “Só ouvir o conteúdo, sem uma interação ativa, não é suficiente para reter os conhecimentos a longo prazo. Ao anotar ou fazer um exercício, áreas diferentes do cérebro são ativadas”, explica Torini.
❌Sobrecarga cognitiva: São muitos estímulos — cores gritantes, cenário dinâmico, agitação, bonequinhos correndo…. Fica muito mais difícil ler/ouvir o texto com atenção.
“É um excesso de elementos visuais muito dinâmicos, competindo com a construção do conhecimento. Não dá para parar e refletir sobre o conteúdo estudado”, complementa o professor.
❌Superficialidade: Os vídeos de “brain rot” são simplificados e não desenvolvem habilidades críticas de análise e de interpretação de texto. O vocabulário usado pelos aplicativos pode parecer mais acessível, mas distancia o aluno de outros gêneros textuais (como o acadêmico).
❌Dificuldade de leitura: A dependência de estímulos rápidos, segundo Torini, faz com que o cérebro se acostume a conteúdos sempre acelerados. A tendência é que tarefas que exigem maior concentração, como a leitura, fiquem cada vez mais desafiadoras para o estudante.
❌Problemas emocionais: O indivíduo pode se tornar dependente desse “looping” de vídeos rápidos. Aos poucos, sintomas como declínio cognitivo, dificuldade de foco, perda de criatividade, cansaço mental e desinteresse por atividades intelectuais podem surgir.
🤔Os professores devem intervir?
Os especialistas ouvidos nesta reportagem insistem que, por mais que professores e pais fiquem assustados diante dos conteúdos de “brain rot”, o mais indicado é “trazer o assunto à tona, em vez de fingir que ele não existe".
“É possível incorporar esses métodos multimodais de estudo e estimular que eles sejam mesclados com experiências de leitura. Eles podem servir para despertar o interesse inicial sobre um assunto ou complementar os estudos — só não podem ser os únicos meios”, afirma o professor da ESPM.
“Não adianta demonizar a inteligência artificial nem achar que ela é a solução dos nossos problemas. Ela é só uma ferramenta. É preciso ter equilíbrio.”
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‘Brain rot’ e ansiedade nas redes sociais

Se bebês formam memórias, por que não nos lembramos dos primeiros anos de vida?

Se bebês formam memórias, por que não nos lembramos dos primeiros anos de vida?
Estudo publicado nesta quinta-feira (21) esclarece, após o monitoramento de mais de 20 bebês, o motivo de certas recordações ficarem inacessíveis com o tempo. Bebê viraliza ao fazer cara de bravo logo após o nascimento em São Roque de Minas, no início de março
Carol Wolf/Arquivo Pessoal
Os primeiros anos dos humanos são um período de aprendizagem rápido, mas normalmente não conseguimos nos lembrar de experiências específicas dessa época: é o fenômeno conhecido como amnésia infantil.
Um novo estudo publicado nesta quinta-feira (20), na prestigiosa revista científica "Science", desafia as suposições sobre a memória infantil, demonstrando que a mente dos bebês é, sim, capaz de formar lembranças.
➡️A pergunta é: por que é tão difícil recuperar essas memórias mais adiante na vida?
"Sempre fui fascinado por este misterioso vazio na nossa história pessoal", disse à AFP Nick Turk-Browne, professor de psicologia em Yale e principal autor do estudo.
Por volta de um ano de idade, as crianças se tornam aprendizes extraordinários: adquirem linguagem, andam, reconhecem objetos, compreendem os vínculos sociais e muito mais.
"No entanto, não lembramos nenhuma destas experiências, pois existe uma espécie de desajuste entre essa incrível plasticidade e nossa capacidade de aprendizado", afirmou.
Sigmund Freud, fundador da psicanálise, sugeriu a hipótese de que as primeiras lembranças são reprimidas, ainda que desde então a ciência tenha descartado em grande medida a ideia de um processo de supressão ativa.
As teorias modernas se centram no hipocampo, área do cérebro crucial para a memória episódica, que não se desenvolve completamente na infância.
Turk-Browne sentiu-se intrigado com as pistas de estudos comportamentais anteriores.
Visto que os bebês não conseguem comunicar verbalmente as lembranças antes de adquirirem a linguagem, sua tendência a observar objetos familiares por mais tempo dá pistas importantes.
Estudos recentes com roedores que monitoram a atividade cerebral também demonstraram que os engramas (padrões de células que armazenam lembranças) se formam no hipocampo infantil, mas se tornam inacessíveis com o tempo, embora possam ser reativados artificialmente mediante uma técnica que usa luz para estimular os neurônios.
Até agora, combinar as observações de crianças pequenas com imagens cerebrais estava fora do alcance, pois bebês são sabidamente pouco cooperativos quando se trata de ficarem quietos dentro de uma máquina de ressonância magnética funcional (fMRI), o dispositivo que rastreia o fluxo sanguíneo para "ver" a atividade cerebral.
Padrões psicodélicos
Para superar este desafio, a equipe de Turk-Browne usou métodos que seu laboratório aperfeiçoou ao longo dos anos: trabalhar com famílias para incorporar chupetas, cobertores e bichos de pelúcia; manter os bebês estáveis com almofadas para que não se mexam; e usar padrões psicodélicos de fundo para prender sua atenção.
O movimento inevitável produziu, no entanto, imagens borradas que tiveram de ser descartadas, mas a equipe solucionou o problema realizando centenas de sessões.
No total, participaram da experiência 26 bebês (sendo a metade de menores de um ano e a outra metade, maiores). Eles tiveram o cérebro escaneado durante uma tarefa de memória, um exercício de estudo para adultos adaptado para eles.
Primeiro, mostraram aos bebês imagens de rostos, cenas e objetos. Depois, após verem outras imagens, exibiu-se uma que já tinham visto antes, junto com uma nova.
"Quantificamos o tempo que passaram olhando o que já tinham visto e essa é uma medida de sua memória para essa imagem", explicou Turk-Browne.
Ao comparar a atividade cerebral durante a formação bem-sucedida de lembranças com a de imagens esquecidas, os pesquisadores confirmaram que o hipocampo participa ativamente da codificação da memória desde a tenra idade.
Isto foi visto em 11 dos 13 bebês maiores de um ano, mas não nos menores.
Eles também descobriram que os bebês com melhor rendimento em tarefas de memória apresentaram uma atividade maior no hipocampo.
"Podemos concluir com precisão que os bebês têm a capacidade de codificar lembranças episódicas no hipocampo desde aproximadamente um ano de idade", afirmou Turk-Browne.
Lembranças apagadas
"A ingenuidade de sua abordagem experimental não deve ser subestimada", escreveram os pesquisadores Adam Ramsaran e Paul Frankland em um editorial da Science.
Mas o que segue sem resposta é o que acontece com estas lembranças remotas. Talvez nunca se consolidem por completo no longo prazo ou talvez persistam, mas se tornem inacessíveis.
Turk-Browne suspeita da segunda hipótese e agora está encarregado de um novo estudo que avalia se bebês e crianças pequenas conseguem reconhecer videoclipes gravados de sua própria perspectiva quando eram bebês.
Os primeiros resultados provisórios sugerem que estas lembranças poderiam persistir até cerca dos três anos antes de desaparecerem.
Turk-Browne se diz intrigado especialmente com a possibilidade de que estes fragmentos possam ser reativados algum dia em etapas posteriores da vida.
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